24/04/2014

SARA CASTRO VENTURA

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 Pela defesa 
dos menores
 
1. A Federação Internacional de Futebol (FIFA) puniu a Real Federación Española de Fútebol (RFEF) e o clube espanhol FC Barcelona (Barcelona) por violação do artigo 19º do Regulamento do Estatuto e Transferências de Jogadores da FIFA (Regulamento), relacionada com as transferências, entre 2009 e 2010, de 10 jogadores com idades inferiores a 18 anos.

Nessa sequência, o Barcelona ficará impedido de efetuar transferências nacionais e internacionais durante duas janelas de transferências (de 1 de julho a 31 de agosto de 2014 e de 1 de janeiro a 2 de fevereiro de 2015). Adicionalmente, o clube foi ainda sancionado no pagamento de uma multa no valor de 450 mil francos suíços (370 mil euros), tendo de regularizar a situação de todos os jogadores menores em questão num período de 90 dias.
Por sua vez, a RFEF foi sancionada no pagamento de uma multa no valor de 500 mil francos suíços (400 mil euros), tendo-lhe sido concedido o período de 1 ano para regularizar o seu sistema de transferências internacionais de menores.

2. A decisão da FIFA resultou de uma investigação com recurso ao Transfer Matching System (TMS) da FIFA conduzida pela Comissão disciplinar da FIFA. O TMS é um sistema on line de transferências cuja utilização na transferência de jogadores profissionais é obrigatória desde 01.10.2010, no qual ambos os clubes envolvidos na transferência de um jogador devem obrigatoriamente prestar informações idênticas sobre os clubes e o jogador para emissão de Certificado Internacional de Transferências, sob pena de bloqueio da transferência.

Para além de ter visado promover e sustentar um mercado de transferência transparente, baseado na integridade, responsabilidade e inovação, o TMS visou reduzir a ocorrência de transferências interacionais de jogadores menores de idade, em relação às quais, desde 2009, para além de todas as solicitações para o primeiro registo de um jogador menor de idade num país que não seja cidadão, é necessária pré - aprovação da transferência pela Subcomissão da Comissão do Estatuto de Jogadores da FIFA, sendo tanto a solicitação inicial quanto o processo posterior de tomada de decisão conduzidos por meio do TMS.

Caso o sistema de TMS detete algum incumprimento do regulamento de transferências (em especial, dos procedimentos de prestação de informações, entrega de documentos, entre outros, previstos nos anexos 2 e 3 do Regulamento) é conduzida uma investigação, sendo que caso se confirme a violação do Regulamento a investigação é remetida para a Comissão disciplinar da FIFA para avaliação e decisão. De acordo com o Código Disciplinar da FIFA, a Comissão disciplinar poderá aplicar qualquer uma das sanções disciplinares previstas no código disciplinar, como por exemplo, multa, repreensão ou advertência, anulação do resultado de um jogo, proibição de transferência, dedução de pontos, entre outras, que poderá aplicar em cumulação, o que sucedeu no caso do Barcelona.

3. Nos termos do regime da proteção de menores (artigo 19º do Regulamento), as transferências internacionais de jogadores apenas são permitidas no caso de jogadores com idade superior a 18 anos, exceto nas seguintes situações:

a) Em caso de mudança de país pelos pais do menor, por razões alheias ao futebol, para o país onde se encontra o clube (argumento mais utilizado para o efeito);
b) Caso a transferência ocorra em território de país membro da União Europeia e o jogador tenha entre 16 e 18 anos, devendo o novo clube provar que ao menor se encontra garantida i) formação e/ ou treino em futebol de acordo com os mais elevados padrões nacionais, ii) formação académica e/ou profissional que garanta a possibilidade de prosseguir outra carreira para além da de futebolista profissional caso esta cesse, iii) integração do menor em família de acolhimento ou alojamento do clube todas as condições necessárias para que o menor tenha acesso adequado à educação;
c) Caso o jogador resida a menos de 50km da fronteira com o seu novo clube e a sede deste esteja a menos de 50km com o país de residência do jogador, perfazendo uma distância total de, no máximo, 100kms, devendo o jogador permanecer com o mesmo domicílio e apresentar consentimento, prestado por escrito, entre a associação do clube em que reside e o novo clube.

4. No prazo de três dias contados da notificação da decisão da Comissão disciplinar da FIFA, poderá ser apresentada intenção de apresentação de recurso da decisão para a Comissão de recurso da FIFA, devendo ser apresentados, nos sete dias posteriores, os fundamentos do recurso (art. 120º do Código Disciplinar da FIFA), o que o Barcelona anunciou que irá fazer. O recurso para a Comissão terá efeito suspensivo quanto ao pagamento das multas mas não quanto à proibição de realização de transferências na próxima época por parte do Barcelona (art. 124º, n.º 2 do Código Disciplinar), sendo ainda possível a interposição de recurso no Tribunal Arbitral do Desporto (art. 126º, n.º 2 do Código Disciplinar da FIFA). Caso não seja procedente, a decisão da Comissão disciplinar da FIFA trará consequências nefastas para a próxima época do Barcelona, em especial quanto a transferências de possíveis sucessores do veterano Carles Puyol e de Victor Valdes que sairão do clube em junho, bem como, por exemplo, na transferência de Alen Halilovic’s, international Croata, que já havia sido anunciado como reforço do clube.

5. A decisão de proibição de transferências e de aplicação de multa aplicada por ora ao Barcelona pela Comissão disciplinar da FIFA não foi ímpar, tendo o mesmo sucedido já em 2010 contra o Chelsea em relação à transferência de Gael Kakuta (sem efeito prático em virtude de o Chelsea ter chegado a acordo com o Raicing Club de Lens, clube onde se encontrava Kakuta) e em 2012 contra o FC Nantes em relação à transferência de Ismael Bangoura do Al Nasr SC.

Tal como entende a FIFA, mesmo que uma transferência internacional possa ser favorável à carreira desportiva de um jogador menor de idade, a proteção do desenvolvimento sadio e apropriado do atleta deve prevalecer. As transferências de menores deverão efetuar-se em linha com a legislação nacional dos vários países e com o Regulamento do Estatuto e Transferências de Jogadores da FIFA, sob pena de total violação dos direitos consagrados aos menores.

6. A partida cada vez mais precoce dos atletas para outros países, sem a conclusão da sua formação e, em inúmeros casos, sem o apoio adequado, constitui uma preocupação partilhada pela FIFA como também pela UEFA (tendo sido um dos onze valores apresentados em 2009 por Michel Platini aos representantes das federações filiadas na UEFA) e pela União Europeia, pelo que a punição imposta pela FIFA ao Barcelona não poderá deixar de ser levada em atenção, como alerta e prevenção, por parte dos clubes portugueses, em face do crescente número de jogadores menores estrangeiros que neles se encontram inscritos.

Associada de ABBC Advogados

IN "A BOLA"
20/04/14

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