10/04/2014

JOANA PETIZ

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A lebre afinal era gato 
– e manhoso

Assim que descobriu que ia mudar de chefe, começou a trabalhar como se não houvesse amanhã. Passou a chegar cedo e a sair tarde, a pilha de papéis na sua secretária desapareceu como por magia, despachou tudo com rigor. E até começou a ter ideias – que era coisa que nunca lhe passaria pela cabeça.

A verdade é que se o novo chefe sonhasse como as coisas eram antes, provavelmente não haveria mesmo amanhã para si, pelo menos ali. E o seu instinto de sobrevivência falou mais alto – nos dias que correm, seria louco se arriscasse perder o emprego. A questão é: tem a certeza que não agiu tarde de mais?

Sempre que se avizinham mudanças estruturais, mesmo alguns dos trabalhadores mais dedicados tendem a adoptar uma de duas atitudes – nenhuma delas saudável. Ficam perdidos, desorientados e positivamente incapazes de reagir, passando uma imagem de incompetência que não corresponde à realidade. Ou transformam-se em super-empregados capazes de fazer o seu trabalho e o de todos os que o rodeiam. 

Escusado será dizer que criar falsas expectativas em relação às suas capacidades é um erro – mesmo porque não aguentará a farsa muito tempo. 

Se tentar ir a todas dificilmente fará alguma coisa de jeito. Aspectos importantes vão necessariamente escorregar-lhe por entre os dedos e vai acabar por fazer asneira. E ninguém é capaz de viver num ritmo infernal – quando não aguentar mais, o seu novo chefe não vai perceber a razão da sua mudança de atitude e ficará desiludido com a lebre que virou gato.

Uma mudança de ares pode ser um excelente ponto de partida para voltar a entusiasmar-se com a sua carreira, mas não exagere naquilo que tenta mostrar. Se é um bom profissional, a consistência deve ser uma das suas qualidades. E mesmo que demore umas semanas, acabarão por reconhecer o seu valor.

Por outro lado, se andou a arrastar os pés nos últimos meses, é pouco provável que essa realidade tenha passado ao lado do chefe, mesmo que tenha começado a dar o litro assim que soube que ele ia chegar. 

Encarar um emprego como quem corre os 100 metros é um erro. Vai cansar-se cedo e descobrirá da pior maneira que a meta nunca mais aparece. Veja-o antes como uma corrida de fundo – há que saber quando acelerar e abrandar, mas o essencial é manter o ritmo.


Chefe de redacção adjunta


IN "DINHEIRO VIVO"
07/04/14

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