17/04/2014

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HOJE NO
"DIÁRIO ECONÓMICO"

Segredos da gestão de José Mourinho 

É o treinador com mais meias-finais de Champions: oito. Chamam-lhe ‘special one’, ‘boss’ e os seus métodos de gestão e liderança já são um modelo de sucesso. Saiba quais são. 

Na fervilhante atmosfera de Stamford Bridge, ao intervalo do Chelsea-PSG, decisivo para a passagem às meias-finais da Champions, César Azpilicueta regressa insatisfeito ao balneário com os companheiros. O 1-0 não chega. José Mourinho há-de surpreendê-los com o discurso. "Disse-nos que estávamos eliminados", contou. "Pediu que jogássemos para o público e que nos divertíssemos. Demos tudo o que tínhamos em campo e passámos." 
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A arte da gestão do treinador passa pelo estímulo do orgulho conforme o próprio admitiu à revista do ‘El País' em Agosto de 2010: "Dentro de 50 anos continuarei na história de clubes como Porto, Chelsea ou Inter. Nós, jogadores e treinadores, os que chegámos a este nível, queremos ganhar por orgulho natural, ou seja, é um orgulho inato."

Os treinos são preparados de modo minucioso. Para Mourinho, o melhor amigo é o bloco de notas. É aqui que aponta tudo o que se passa nos treinos. O melhor treinador do mundo não gosta do desconhecido e, por isso, tenta reduzir ao máximo a imprevisibilidade de cada jogo. "Manda fazer exercícios para simular jogadas quando a equipa está a ganhar, a perder ou no caso de algum jogador ser expulso e termos de jogar com menos um", conta um antigo adjunto.

Aqueles que trabalham ao seu lado identificam-lhe traços de mestria como motivador. Internacional italiano, campeão mundial em 1982, Gabriele Oriali trabalhou de perto com o português no Inter e, ao diário ‘La Gazzetta dello Sport', sublinhou a motivação como pano de fundo no sucesso de Mourinho. E usou a vitória obtida ante o Bayern na Champions de 2010, indicando que não estavam apenas 11 em campo, mas cerca de 30. Aos jogadores juntavam-se os suplentes, os colaboradores, a equipa médica e massagistas, unidos em torno do técnico. Além disso, não é escravo de uma ideia ou táctica.

Exímio a decidir sob pressão, o português antecipa os problemas para vencer. Na semana de um jogo decisivo, pede ao plantel para imaginar dois cenários de 15 minutos diferentes: num deles estariam a ganhar e no outro a perder. O segundo ponto é o que merece mais reflexão. Aqueles minutos podem ser tudo o que têm para ganhar a partida. Os jogadores falam entre si e com José Mourinho sobre o que teriam de fazer para dar a volta ao resultado. Um exemplo de sucesso desta metodologia aconteceu logo em Fevereiro de 2005 quando a equipa londrina jogou a final da Taça da Liga com o Liverpool - o desafio seguiu para prolongamento e, em apenas 15 minutos, o Chelsea marcou dois golos, acabando o jogo a vencer por 3-2.

Dez minutos antes de subir ao relvado, pode pedir a um dos jogadores mais experientes (Terry e Lampard no Chelsea, por exemplo) para fazer um discurso de incentivo ao grupo. A palavra vencer é a que mais vezes se repete. "Escolhe estes porque são os que têm uma personalidade mais forte", afirma a mesma fonte.
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Além disso, há sempre alguém da equipa de Mourinho que observa os adversários e depois elabora relatórios detalhados sobre como defendem e atacam, pontos fracos e fortes e a forma de executar os lances de bola parada. Os relatórios são entregues numa segunda-feira ao treinador e a cada jogador, escritos em páginas A4. Tudo detalhado, como Mourinho gosta: há informações sobre o modo de jogar de cada futebolista adversário e depois uma apreciação generalizada. Não faltam também os gráficos com estatísticas. No dia seguinte, o treinador reúne-se com os atletas numa das salas do clube. Aí, dá as primeiras indicações sobre o que fazer no jogo. Os pormenores vão sendo analisados ao longo da semana até à última reunião, quatro horas antes da partida.

Um craque da comunicação
Michael Robinson, antigo avançado que chegou a campeão europeu no Liverpool (83/84), mas não suportou ser concorrente de uma dupla como Dalglish e Rush, tornou-se comentador desportivo e ficou com uma impressão positiva após um mês de convivência na antiga Jugoslávia: "Usa um disfarce perante os media, mas é um craque da comunicação, generoso com os jogadores - diz-lhes que são eles a ganhar e ele quem perde e, por isso, adoram-no. Transmite-lhes amor e respeito; é mais brando do que duro. As suas guerras dialécticas são momentâneas, pequenos instantes numa vida que inspira carinho especial."

"Aprendi com o meu pai, para mim um exemplo, que o mais importante de um treinador e talvez de um homem é a honestidade. Cometerei erros de decisão, nas análises, mas guardarei o máximo de honestidade para os meus jogadores", assumiu Mourinho na revista espanhola quando estava a começar a temporada inicial no Real Madrid, em Agosto de 2010.
Sobre a base dos seus conhecimentos, uma explicação invulgar: "O meu pai casou-se com uma professora de português e essa combinação levou-me, por um lado, a amar o futebol, mas, ao mesmo tempo, a presença da minha mãe, a sua actividade, influenciou-me a ter um pouco de controlo nessa paixão e manter uma motivação cultural e académica. Quando tinha uns 17 anos conheci a minha mulher. Ela também tem formação universitária, de Filosofia, eu estudei Educação Física, portanto, a formação do meu pensamento é fruto da união de duas áreas que alguns crêem incompatíveis: a universidade e o futebol."

As decisões na vida pessoal
No início não faltaram decisões difíceis. Em 1990, o treinador Manuel Fernandes convidou-o para a equipa técnica no Estrela da Amadora, uma oportunidade para entrar no futebol profissional. O jovem hesitou: na altura, era professor de Educação Física na Escola Secundária de Alhos Vedros. Além disso, ainda recebia 50 contos por mês (250 euros) para treinar os juvenis e os juniores do Vitória de Setúbal. Estava com dúvidas e pediu a opinião da mulher, Tami, que foi firme: disse-lhe para aceitar o cargo na Amadora.

Muito depois, em Junho de 2000, voltou a correr riscos. Depois de ser adjunto de Bobby Robson e Louis van Gaal no Barcelona, conversou com o holandês sobre um convite que recebera para treinar e foi incentivado a aceitar a proposta do Benfica, liderado por João Vale e Azevedo. Foi de férias para uma pequena moradia, em Ferragudo, no Algarve.

Ali brincou com os dois filhos, José Mário e Tita, deu longos passeios pela praia e aproveitou para ler livros e ver DVD sobre futebol. Ao mesmo tempo, elaborou um dossier de treino onde escreveu tudo o que aprendera. Mais tarde, já bicampeão nacional, vencedor da Taça UEFA e campeão europeu pelo Porto, quando o milionário Abramovich o contratou para o Chelsea, a escala mudou: interessou-lhe o prestígio mundial e o dinheiro, negociando um ordenado anual de 7,5 milhões de euros.

No começo da aventura em Espanha, foi firme: "No futebol sou um homem de risco total; na vida privada, risco zero." E, questionado sobre os tempos livres, constatou factos: "Gosto de Gabriel García Márquez, mas tenho pouco tempo para ler. Trabalho muitas horas e quando chego a casa gosto de estar com os meus. Não posso ser tão egoísta ao ponto de exigir o meu próprio espaço. Rio muito em casa e no meu ambiente de trabalho."
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Mais difícil torna-se saber, de facto, quem é José Mourinho. "Ninguém conhece Mourinho, só a família, os amigos e quem me conhece de verdade. Não gosto da vida social. Perdi a minha privacidade, não posso passear com os filhos, a mulher, a família, não posso andar na rua nem viajar com tranquilidade. E tenho de ler muitas mentiras - quando leio - sobre mim", confessou.

* Se tivéssemos um primeiro-ministro com 20% das capacidades intelectuais de José Mourinho não teria sido necessário o resgate.


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