20/03/2014

JORGE FIEL

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O pai porreiro 
ganha muito dinheiro

Sou um pai global. A Mariana vive e trabalha em Los Angeles, para onde emigrou após se ter apaixonado pelo Tom (uma cortesia da Internet). O Pedro está a virar frangos (no Nando's) e a fazer um curso de técnico de som em Dublin, para onde emigrou após se apaixonar pela Irlanda no ano de Erasmus que fez em Galway. O único que está por cá é o João, nascido no ano 2000. Além de pai global, sinto-me satisfeito por ter contribuído para uma evolução mais favorável da taxa de natalidade. Em 1960, todos os meses nasciam 586 bebés. Agora é menos de metade, 246/mês, o que dá uma vergonhosa taxa de natalidade de 1,28 por casal. Uma miséria. 
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Se toda a gente tivesse três filhos, a renovação geracional estava assegurada. Mas por favor não entendam mal este autoelogio. Se soubesse o que sei hoje, pensaria três ou quatro vezes antes de iniciar a carreira de pai, marcada por inúmeros incómodos e canseiras - e não estou a falar das minudências folclóricas das noites mal dormidas ou da mudança de fraldas malcheirosas e com o recheio a transbordar. 

Não. Estou a referir-me a coisas tão sérias como o facto da condição de pai não prescrever, ao contrário das multas aplicadas aos banqueiros malfeitores. Uma vez pai, sempre pai. Não importa a idade, sempre que tiverem um contratempo, o mais certo é que eles, filhos, continuarão a olhar para nós, pais, como uma ATM que nunca lhes responderá que o saldo disponível não lhes permite fazer essa operação.

Uma pessoa pode mudar de emprego, profissão, mulher, cidade, país, partido ou até de clube de futebol, mas nunca conseguirá deixar de ser pai. Ser pai é tramado não só por ser um cargo vitalício, pessoal e intransmissível, mas também porque ninguém nos ensina a educar uma criança (e muito menos um adolescente), matéria tão ou mais difícil do que aprender física quântica ou solucionar o Teorema de Fermat.

Ser pai fica caro. Um pai porreiro ganha muito dinheiro, como escreveu o Alface. Se tivesse investido em certificados de aforro o dinheiro que até agora gasto com os meus três filhos, teria uma fortuna suficiente para passar o tempo que me resta a viajar, ler e ouvir música - sem ser mais obrigado a trabalhar.

Dantes, os filhos eram um investimento que os pais faziam com a esperança num retorno material: ajuda no cultivo dos campos ou contribuição para o orçamento familiar e, mais tarde, garantia de cuidados e conforto na velhice.

Hoje, a relação entre pais e filhos é tão desequilibrada, que nas vésperas de mais um Dia do Pai fiz a homenagem póstuma de substituir, como screen saver do computador, uma fotografia minha de bebé com seis meses, com o rabinho ao léu, por uma do meu pai, com trinta e tal anos, quando ainda tinha cabelo. 

São emocionais os únicos dividendos que podemos esperar do avultado investimento nos filhos. Mesmo assim, não me arrependo de ter optado por ser pai. É que sinto cá dentro um calorzinho tão bom quando a Mariana, o Pedro e o João me dão boas notícias, os vejo felizes e eles me dão beijos e abraços apertados.

IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
18/03/14

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