08/11/2013

NUNO CUNHA ROLO

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Porta-guião

A palavra "guião" pode significar pessoa ou estandarte que segue à frente das tropas numa batalha, ou, mais recentemente, roteiro, argumento. Em rigor, o "guião da reforma do estado" (GRE) corresponde ao primeiro. 

Portas e o GRE, respectivamente, são os protagonistas deste filme negro de acção governamental. Mas a metáfora é imparável. O Porta(s)-guião deste Governo simula que o segura, o estandarte é brandido sem crença das tropas e a batalha (eleitoral) que o justifica está a ano e meio de se travar.

Resta o significado do argumento, embora os actores tenham decidido fazer greve da sua aplicação no filme que protagonizam e vinculá-lo em jeito de guia de marcha para o próximo que se segue. Um derradeiro acto de rendição e desespero deste governo, que procura apagar os prejuízos da crise que agravou, inculpar o veto responsável dos opositores e sobreviver eleitoralmente ao falhanço da sua capacidade reformista. A audácia não tem limites: o documento parece feito de "cola de gabinete", desprovido de orientações políticas tecnicamente contextualizadas e imbuído de contradições e armadilhas retóricas estendidas à oposição, e aos cidadãos. Exemplos: diz-se "aberto", mas só se dirige aos partidos e parceiros sociais; afirma o "gradualismo", mas quer "mudar de modelo" de estado; acusa a necessidade de se pensar no "produto", mas defende que a redução do défice é o "único caminho" para dar esperança aos portugueses.

Mais, omite-se o pai político do "estado pós-burocrático" (David Cameron) e o pai jurídico do "estado simples" (Cass Sunstein), sem conhecer dos pressupostos ideológicos antagónicos de ambos.

 O documento não resiste, por último, a uma análise de conteúdo típica de um "GRE": redução/reduzir aparecem 50 vezes, financismos 47, espesa/défice/dívida 70, porém, motivar, esperança ou igualdade, apenas uma vez! Pior, não há qualquer menção a liderança, estado-empreendedor, bem-estar ou co-produção de serviços públicos, imperativos de um estado sustentável e "confiável". Concluindo, a "boa governação" é, mais do que nunca, um desígnio soberano de reforma do nosso Estado.

IN "DIÁRIO ECONÓMICO"
05/11/13


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