HOJE NO
"PÚBLICO"
Juízes dizem ser "manifesta"
a intenção de ex-secretário de
Estado favorecer primo
Magistrados da Relação acham "incompreensível" restrição do concurso a licenciados em História de Arte
Os juízes do Tribunal da Relação de Coimbra que decidiram levar a
julgamento o ex-secretário de Estado Paulo Júlio pelo crime de
prevaricação consideram que a conjugação de todos os indícios existentes
no processo torna "manifesta" a intenção do então presidente da Câmara
de Penela em favorecer um primo num concurso para chefe de divisão da
autarquia.
"Se é certo que cada um dos pontos indicados por si só poderiam não ser
suficientes para aquilatar da intenção do arguido ao abrir o concurso
em causa, a conjugação de todos eles é por demais manifesta quanto
àquela intenção: beneficiar o concorrente M.D.", lê-se no acórdão a que o
PÚBLICO teve acesso.
QUANTO MAIS PRIMO.... |
Os juízes desvalorizam o facto de o Ministério Público ter descoberto
que o candidato vencedor era primo de Paulo Júlio apenas pelo testemunho
do próprio parente, uma situação realçada pela juíza de instrução, que
optou por não pronunciar o antigo autarca. "Quanto a nós, entendemos
que, independentemente da forma como veio a ser apurada a relação de
parentesco, o que é certo é que de facto existe essa relação de
parentesco e ambos tinham consciência disso", afirmam os magistrados. E
acrescentam: "O depoente, enquanto técnico superior da Cultura,
despachava directamente com o arguido. Ora não só havia relação de
parentesco, que poderia ser inócua, mas, mais importante, havia relação
de confiança e conhecimento directo".
Ao contrário da juíza de instrução, os juízes da Relação estranham a
restrição do concurso para chefe de divisão de Cultura, Turismo,
Desporto e Juventude apenas a pessoas licenciadas em História da Arte.
Os magistrados lembram os depoimentos de várias testemunhas de defesa
que acabaram por admitir que cursos como História, Arqueologia, Geologia
e Geografia seriam igualmente pertinentes face ao objectivo traçado
pelo município. "É no mínimo incompreensível, como aliás se refere no
relatório da Inspecção-Geral da Administração Local, a restrição
imposta", escrevem os juízes. E questionam: "Se era assim tão
fundamental, por que motivo do júri do concurso não fez parte qualquer
elemento formado em História de Arte?".
Estranham ainda que, na
entrevista pública, os candidatos não tenham sido questionados sobre
esta área.
Sobre a escolha de um antigo professor do candidato vencedor para
membro do júri, feita por Paulo Júlio, que presidia ao colectivo, os
juízes notam: "Ora, o prof. Lúcio Cunha, que nem sequer tinha formação
em História de Arte, foi professor do funcionário M.D., que com este
também mantinha contactos profissionais regulares, por ser coordenador
científico de instituto da Câmara de Penela. Trabalhava em colaboração
com o município de Penela e foi M.D. quem fez a aproximação entre o
prof. Lúcio e a Câmara de Penela".
O facto de o júri ter acabado por admitir um candidato licenciado em
História é considerado suspeito pelos juízes. "Se calhar, a necessidade,
à ultima da hora, de fazer crer na transparência do concurso foi a de
admitir a licenciatura em História - que se sabia ser inócua -, mas que
importava que fosse aceite para dar "mais credibilidade". Aumentando o
número de candidatos admitidos. Não vemos outra justificação plausível e
que se coadune com a posição sempre assumida pelo arguido de que só a
licenciatura em História de Arte é que preenchia os requisitos que se
tinham proposto para o cargo", rematam os juízes.
Em 2011, Paulo Júlio saiu da autarquia para ocupar o lugar de
secretário de Estado da Administração Local e Reforma Administrativa,
tendo-se demitido em Janeiro, na sequência desta acusação.
* Muito trabalho terão os senhores juízes se se dedicarem com minúcia à investigação dos compadrios autárquicos. Este governo já não tem pano, apenas nódoas.
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