14/10/2013

CARLA HILÁRIO QUEVEDO

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O independente


Toda a gente sabe que as autárquicas não são eleições nacionais, mas também toda a gente repete ou insinua com fervor que, apesar disso, nos dão uma ideia de às quantas andamos. Continuo a pensar que pouco nos dizem. E é preferível que assim seja. De outro modo, o que devemos pensar quando ouvimos os gritos de ‘I-sal-tino, I-sal-tino’ para receber o novo autarca de Oeiras? Que conclusões devemos tirar quando se elogia a famigerada humildade do derrotado Luís Filipe Menezes e se esquece a irresponsabilidade da sua candidatura desligada da realidade nacional? Que mérito tem António Costa quando o seu concorrente directo é ainda mais fraco como político do que como comentador desportivo? Mas apesar de tudo, talvez só no Porto pudemos ver um pouco do futuro que nos espera. Um independente que, apesar de ter apoio partidário, acreditam com alguma ingenuidade ser de sangue e moral novos. Qual será o independente nacional que nos espera?

Bom gosto
Uma notícia no Telegraph chamou a minha atenção para uma realidade que me estava a passar ao lado. Parece que o sucesso de Cinquenta sombras de Grey, que não li, não vou ler e não gosto, fez aumentar as vendas de brinquedos eróticos. Algemas, vibradores, etc, fazem agora parte dos lares de muitas famílias. Muitas, mas não todas. Na pequena cidade de Aberystwyth, no sul de Gales, a única sex shop abriu falência porque não conseguiu vender um único par de cuecas atrevidas aos locais. A proprietária da loja Nice ‘n’ Naughty, Trish Murray, avançou, desolada, para uma explicação: ‘Talvez as pessoas de Aberystwyth não sejam suficientemente perversas’. A perversão está aqui como tradução pouco rigorosa de ‘kinky’, com as minhas desculpas. Penso que Ms Murray pode estar a sobrestimar os produtos que vende e a subestimar os habitantes desta terra de nome impronunciável. Pode ainda dar-se o caso de os aberystwythianos terem bom gosto literário.

Em defesa da abstenção
Falei aqui quase nada sobre as eleições autárquicas porque decidi há algum tempo que não iria votar nestas eleições. As razões são simples. A polémica sobre os dinossauros autárquicos deprimiu-me e uma pessoa deprimida sai menos de casa. Depois, a decisão do Tribunal Constitucional ainda me deprimiu mais. Se eu fosse o Tribunal Constitucional (todo, bem entendido), tinha enviado a lei de volta para a Assembleia, alegando não ter competência para decidir sobre um assunto da responsabilidade dos senhores deputados. Assim, ficou tudo esquisito. Havia um problema sério e ninguém o quis resolver. Na minha cidade de Lisboa, os candidatos eram invotáveis, se me permitem o neologismo. Perante um cenário impossível, a única decisão sensata era não pôr lá os pés. No dia seguinte, muitos dos que votaram trataram com desprezo os que se abstiveram de o fazer. Como se escolher não votar não fosse um direito e a abstenção não tivesse significado.

Coragem feminina
As notícias sobre a violação e morte de uma estudante num autocarro em Nova Deli chegaram incompletas a esta parte do globo. Parece que um sector da sociedade culpou a vítima. O guru Asaram Bapu foi uma das personalidades que defendeu que a vítima agira mal ao ter resistido e ao não ter chamado ‘bhaya’ (irmão) aos atacantes, que assim a teriam deixado em paz. Como reacção aos comentários machistas como este, algumas mulheres, entre as quais a actriz Kalki Koechlin, fizeram um vídeo intitulado ‘It’s my fault’, ‘A culpa é minha’, em que apresentam as causas principais de violação. A minha preferida aparece logo no início e tem a ver com o vestuário. Nenhuma das opções apresentadas, da minissaia à burca, são aceitáveis. Se a mulher estiver vestida de astronauta, também é culpada de ter sido violada, ‘porque os homens têm olhos!’ O humor do vídeo não é para estômagos sensíveis_e recomendo absolutamente: 
www.youtube.com/watch?v= 8hC0Ng_ajpY.

Clientela selecta
Um leitor da Slate perguntou ao editor de economia, Matthew Yglesias, por que razão Walter White, o professor de Química que se torna fabricante de metanfetaminas na série Breaking Bad e faz uma fortuna com a droga, com os problemas adjacentes de lavagem e armazenamento do dinheiro, não põe o dinheiro nas ilhas Caimão ou na Suíça. Yglesias, com desassombro profissional, explica que os bancos na Suíça e nas famosas off-shores foram feitos para os ricos fugirem aos impostos ou para maridos e mulheres que querem evitar divórcios custosos. Estes bancos têm de conhecer, pelo menos oficialmente, a origem do dinheiro. Os terroristas, mafiosos, narcotraficantes ou ditadores não são os clientes adequados. Os bancos suíços responsabilizam Hollywood pela percepção fraudulenta e paradisíaca que deles tem o comum dos cidadãos. Não sei se o leitor terá ficado satisfeito com a resposta. Eu não fiquei. E Hollywood não tem nada a ver com isso.

IN "SOL"
09/10/13

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