11/09/2013

TIAGO ANTUNES

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Dinossauros à solta

O Tribunal Constitucional decidiu, está decidido. E, na minha modesta opinião, está bem decidido. Havendo dúvidas quanto ao sentido da lei, e tratando-se de uma matéria relativa a direitos fundamentais (como é o direito a candidatar-se e a ser eleito), o Tribunal nunca poderia optar pelo sentido mais restritivo.

 Acresce que a Constituição prevê "limites à renovação sucessiva de mandatos". E dificilmente se poderá argumentar que a vitória num concelho consiste na renovação de um mandato exercido noutro concelho.

Por fim, creio a ‘ratio' da lei é a de impedir que alguém se possa perpetuar no poder tirando partido da vantagem de incumbente, que pode viciar a competição eleitoral em seu benefício - o que não ocorre quando a candidatura diz respeito a uma autarquia distinta. Isto é, o risco de manipulação, condicionamento ou dependência entre eleito e eleitores não se verifica quando o eleitorado é outro. E, não havendo esse risco, deve prevalecer a liberdade de escolha democrática. Assim, se o legislador quisesse travar candidaturas em qualquer território, teria que o ter dito expressamente.

E não o fez. Esta é, aliás, a fonte do problema. É que a Assembleia da República, quando aprovou o regime da limitação de mandatos, deixou um enorme buraco interpretativo na lei. E, alertada mais tarde para esse facto, recusou-se a tapar o buraco, permitindo que algum candidato nele tropeçasse, ou não, à beirinha da corrida eleitoral. Pelo caminho, os nossos órgãos de soberania lançaram-se em investigações Sherlock Holmesianas às catacumbas do Diário da República e enredaram-se em extravagantes discussões linguísticas em torno de um "de" ou "da", que supostamente tudo clarificaria, quando na verdade apenas adensou a confusão. Enfim, cenas pouco edificantes, designadamente face à relevância do que estava em jogo. Valeu-nos o Tribunal Constitucional, que tão vilipendiado tem sido nos últimos tempos, mas que aqui, mais uma vez, deu provas de um grande bom senso.

O Tribunal não está imune à crítica e não acertará sempre, mas, por mais que isso possa desagradar a alguns zelotes de serviço, tem-se revelado um bastião de segurança e razoabilidade, em tempos de grande convulsão política e financeira.

IN "DIÁRIO ECONÓMICO"
09/09/13

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