04/09/2013

HELENA FREITAS

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O declínio da ciência

Nos últimos dias, enquanto participava numa comissão de avaliação de projectos de investigação científica na Alemanha, num ambiente de relativa satisfação e desafogo financeiro, fui acompanhando as contrastantes manifestações públicas de desalento por parte de investigadores espanhóis, em especial a atitude de uma cientista espanhola, que decidiu entregar ao primeiro-ministro Mariano Rajoy, de forma simbólica, todos os certificados que atestam a sua longa e sólida formação científica, anunciando  a intenção de abandonar Espanha, e de continuar a sua carreira científica e académica  nos Estados Unidos da América. “Cuando emigre, próximamente, la ciencia que yo haga ya no será española, ni será gracias a España; seguiré haciendo ciencia a pesar de España” dizia esta investigadora, notoriamente desapontada com as opções políticas do actual governo espanhol, a quem acusa de ter condenado a ciência espanhola a um retrocesso incompreensível e lamentável.
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Quem acompanha a ciência internacional e a sua evolução nas últimas décadas não pode deixar de reconhecer a pujança e a qualidade que a ciência espanhola alcançou nos anos mais recentes. O agora vaticinado retrocesso terá um grande impacto na produtividade científica deste país, e conduzirá a um inevitável êxodo de investigadores altamente qualificados, jovens e seniores, para outros países, não necessariamente europeus. 

A partir de Portugal, vamos observando com tristeza e apreensão esta tendência negativa, perspectiva que em grande medida partilhamos. Ainda assim, mantemos alguma confiança nas instituições nacionais, a quem reconhecemos o esforço de procurar assegurar a credibilidade suficiente para acalentar a aposta na ciência. Mas percebemos que a incerteza é grande, e as expectativas de uma mudança favorável nos próximos anos são claramente nulas. Apesar deste cenário desanimador, os investigadores portugueses não estão dispostos a perder a capacidade competitiva internacional; bem pelo contrário. A ciência nacional tem mantido e quer manter uma tendência globalmente positiva, pelo que importa garantir a estabilidade e o financiamento que permitam a competitividade e o progresso da ciência nacional.

Dito isto, não escondo a perplexidade com que soube de mais um corte previsto no orçamento das universidades portuguesas. Mais uma vez, uma decisão absurda e injusta, que coloca o ónus sobre instituições que têm revelado uma gestão eficiente do financiamento público, respeitando os orçamentos, e garantindo um ensino que tem sido consistentemente melhor avaliado nos indicadores e avaliações internacionais. Esta decisão, será naturalmente muito penalizadora da actividade científica que em Portugal se desenvolve em grande medida nas universidades. A acontecer, inviabilizará o funcionamento adequado das instituições, e desmotivará ainda mais um grupo de profissionais submetidos a escrutínios cada vez mais exigentes, e que, para além de desenvolverem o trabalho que lhes compete – no ensino e na actividade de investigação –, têm ainda a responsabilidade de manter vivas as expectativas dos jovens que buscam o seu percurso profissional na ciência.

Estes jovens investigadores, estão  motivados pela vontade de contribuir para o progresso do seu país, mas é cada vez mais difícil acalentar o sonho que os conduziu à ciência, porque o desânimo é crescente e está instalado na comunidade universitária. Fragilizar ou inviabilizar o funcionamento das universidades portuguesas, situação que decorrerá inevitavelmente desta nova proposta de orçamento, concorrerá para o declínio da ciência nacional, e é sobretudo um forte contributo para o retrocesso de Portugal.

IN  "PÚBLICO"
29/08/13

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