11/09/2013

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HOJE NO

"PÚBLICO"



A frutose está no centro do turbilhão químico que causa um fígado gordo

A glicose em excesso está associada a uma série de problemas de saúde.

Entre os alimentos que ingerimos e as substâncias absorvidas na corrente sanguínea dão-se várias reacções químicas que transformam moléculas gigantes em pequenas substâncias que atravessam o intestino. Mas dentro do corpo, no sangue, os açúcares, e outras moléculas que absorvemos, entram de novo em muitos ciclos bioquímicos que resultam na construção de células, na produção de energia ou, por vezes, na acumulação de gordura (que, em excesso, pode constituir um problema de saúde). No fígado dos ratinhos, esta acumulação negativa de gordura - quando há açúcar em excesso - passa pela produção de frutose, mostra agora um estudo publicado ontem na revista Nature Communications. Quando esta frutose é bloqueada, evita-se nos ratinhos doenças associadas ao excesso de açúcar no fígado.
QUASE VENENO

"Descobrimos que parte da glicose [no sangue do ratinho] está a ser convertida em frutose no fígado, e esta frutose é responsável por parte da obesidade dos ratinhos, assim como pelo fígado gordo e pela resistência à insulina", diz ao PÚBLICO Richard Johnson, líder do estudo e investigador da Universidade do Colorado nos Estados Unidos.

A frutose está presente na fruta e no mel, mas também existe no xarope de milho que adoça os refrigerantes e é um constituinte da sacarose - a molécula que compõe o açúcar da cozinha é feita por uma unidade de frutose ligada a outra de glucose.

"A frutose pode ser vista como um açúcar mais amigo porque exige menos insulina, para o seu tratamento no sangue, do que a glicose. Por isso, o seu índice glicémico é mais baixo", explica Pedro Moreira, nutricionista e vice-presidente da Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto.

O especialista, que não está ligado ao trabalho, chama a esta frutose encontrada no fígado de "endógena" porque, ao contrário daquela que é absorvida durante a digestão, esta é produzida pelo corpo do mamífero. Por isso, é difícil encontrar paralelos entre as consequências desta frutose endógena e daquela que é ingerida, refere Pedro Moreira.

Mas o que acontece à frutose no fígado? A equipa de Richard Johnson estudou ratinhos que tinham uma dieta alimentar rica em açúcar, mas utilizou dois grupos diferentes. Um deles era normal, e um outro grupo que tinha uma mutação genética que impedia a produção de uma proteína normal responsável pela reacção enzimática que acrescenta uma molécula de fosfato à frutose.

No fígado cheio de glicose dos dois grupos de ratinhos, davam-se as reacções normais responsáveis pela passagem da glicose para a frutose. A diferença é que nos ratinhos normais a série de reacções bioquímicas continuava normalmente a partir da frutose, ao passo que no grupo com a mutação genética as reacções terminavam na frutose.

Os investigadores observaram que, no grupo controlo, os ratinhos desenvolviam um fígado com células cheias de gordura, ficavam com síndrome metabólica - que nos humanos é um conjunto de factores que passa pela obesidade abdominal, valores altos de triglicéridos, valores baixos do "bom" colesterol, glicose e pressão arterial altas -, além de desenvolverem diabetes. Estes sinais não surgiam no outro grupo. "Se bloquearmos o metabolismo da frutose, podemos prevenir estas mudanças", conclui Richard Johnson.

O estudo mostra uma "nova estrada da glicose" que leva à "produção endógena da frutose", interpreta Pedro Moreira, que defende que o próximo passo é perceber se "isto que encontram nos ratinhos também acontece nos homens".
Para Johnson, estes resultados "desafiam o dogma de que a frutose é segura e que só os hidratos de carbono que causam glicémias altas é que devem ser restringidos".

* Por causa da frutose exógena há muito que se diz ser bom comer apenas duas peças de fruta por dia e evitar a ingestão dos outros açucares.

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