27/08/2013

SOFIA LORENA

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A revolução 
nunca aconteceu?

Foi há pouco mais de um ano: “Hosni Mubarak condenado a prisão perpétua”. A frase teria parecido impossível antes de Janeiro de 2011, mas em Junho de 2012 fazia todo o sentido. Mesmo com a condenação, a Tahrir encheu-se de jovens manifestantes – afinal, seis responsáveis do Ministério do Interior tinham sido ilibados do mesmo crime, cumplicidade na morte de 846 manifestantes durante os 18 dias de protestos que levaram o Exército a afastar Mubarak do poder. 

Mubarak não saiu da prisão para um exílio dourado. Saiu de Tora para um hospital e é ali que vai aguardar pela repetição do julgamento. O “faraó” nunca voltará ao palácio. Mas os egípcios que em Junho do ano passado protestaram contra a sentença dos chefes da polícia e que tantas vezes antes tinham saído à rua para pressionar os generais e garantir que o ditador pagava pelos seus crimes, estão agora anestesiados. Vêem Mubarak sair de Tora e as celas de Tora a encher-se com dirigentes da Irmandade Muçulmana e isso parece-lhes normal. Assistem ao regresso do estado de emergência contra o qual lutaram – antes da revolução até, quando o medo da prisão, da morte, da palavra, era a cola que mantinha a ditadura – e aceitam-no como uma inevitabilidade, um remédio amargo e necessário para se livrarem da Irmandade Muçulmana.
A 2 de Junho de 2012, quando Mubarak foi condenado pela morte de centenas de jovens egípcios, faltavam duas semanas para a segunda volta das presidenciais. Mohamed Morsi, da Irmandade Muçulmana, enfrentava nas urnas o último primeiro-ministro do ditador, apoiado pelos generais que tinham assumido o controlo do país e que faziam tudo para conservarem direitos e privilégios, salvando o que podiam do regime. Jovens revolucionários de esquerda e laicos preparavam-se para engolir em seco e votar num islamista, pensando que assim davam mais um pequeno passo para enterrar 60 anos de ditadura militar.

O fim da ditadura militar não é impossível mas hoje não é para isso que o Egipto caminha. O derrube de Morsi, primeiro Presidente egípcio escolhido em eleições livres e democráticas, pode ter sido forçado pelas manifestações de milhões a pedirem a sua demissão mas não deixou por isso de ser um golpe militar. Um golpe dos generais que sempre controlaram os destinos do Egipto. Morsi podia ser incompetente, sectário e até ter um plano secreto para transformar o Egipto no Irão, mas isso não apaga a morte de centenas de apoiantes da Irmandade às mãos das forças de segurança. O que aconteceu nas últimas semanas não é por isso menos massacre.

Os egípcios que agora toleram as mortes e as detenções ainda são os mesmos que lutaram na Tahrir contra os julgamentos militares de civis e a brutalidade da polícia. Os egípcios que agora vêem Morsi ser preso e Mubarak ser colocado em prisão domiciliária ainda são os mesmos que arriscaram a vida para terem eleições em vez de faraós. Estão só anestesiados.

IN "PÚBLICO"
22/08/13

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