15/08/2013

MARIA JOÃO TOMÁS

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O secularismo 
e o Islão

Os milhares de pessoas que, um pouco por toda a Tunísia, têm saído à rua nesta semana exigindo a demissão do Governo do Ennahda, estão também descontentes com a governação dos islamitas no seu país, e ambicionam conseguir aquilo que os egípcios fizeram com a revolução do Tamaroud.
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Desesperados com a falta de uma constituição, que está para ser feita quase desde que Ben Ali saiu, não percebem este longo atraso e a indefinição política em que vivem. O assassínio do líder de esquerda, Chokri Belaid, em fevereiro deste ano, agravou ainda mais a situação, porque levou à demissão do primeiro-ministro, Hemad Jebali, à formação de um governo provisório para terminar a constituição e à marcação de novas eleições, que nunca foram definidas no calendário. Para piorar tudo, em 26 de julho passado, foi morto um outro opositor, Mohamed Brahmi, alegadamente pelo mesmo jihadista que deu um tiro no primeiro. Agora com estas manifestações, o presidente da Assembleia Nacional Constituinte, Mustapha Ben-Jafaar, voltou a suspender os trabalhos, e se mau estava, caótico ficou.
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A revolta dos tunisinos tem, apesar das diferenças, muito de comum com a dos egípcios, porque ambos reclamam contra a Irmandade Muçulmana, eleita democraticamente nos dois países, mas que, passado um ano de poder, conseguiu colocar aqueles que votaram neles nas ruas a pedir para saírem. O líder do partido no poder, Rached Ghannouchi, já veio alertar para o perigo de um golpe militar, igual ao que diz ter acontecido para depor Morsi, mas os milhares de pessoas que enchem as ruas em manifestações diárias de protesto dizem que não vão desistir, enfrentando jihadistas que chegam todos os dias e que estão a criar uma instabilidade inaudita neste recanto do Mediterrâneo do Sul. Se o Exército vai intervir em defesa da população, como os seus homólogos egípcios dizem ter feito, só o futuro o dirá, muito embora com essa atitude possam correr o risco de serem criticados por abuso de poder, tal como a Prémio Nobel da Paz Tawakkul Karman já o fez.
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De qualquer forma, este antagonismo face à Irmandade Muçulmana parece ser contagioso, e até na Líbia, onde eles não ganharam as eleições, as suas sedes têm sido atacadas e incendiadas.
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A revolta contra os partidos islamitas a que estamos a assistir, mais de dois anos passados após as primeiras revoltas da Primavera Árabe, parece estar a trazer a vontade de secularizar a política e a democracia nesta região, uma vontade anacrónica para muitos de nós, mas se nos lembrarmos do papel que os partidos democratas-cristãos tiveram em algumas partes da Europa, até há bem pouco tempo, não é assim tão estranha nem tão distante. A democracia é um processo de aprendizagem longo, que se faz com o tempo. É natural que a população destas jovens democracias confiasse o poder à oposição das ditaduras, ou seja, aos partidos nascidos dos movimentos religiosos. Insatisfeita com os resultados, sai agora à rua, reclamando algo que nós também fizemos: que a política e a religião sejam dois mundos que vivam separados, sem que a prática de uma colida com os princípios da outra, porque a sobreposição de qualquer uma prejudica e cria confusões, como a de que o terrorismo jihadista é um ato religioso enquanto, na realidade, é apenas uma forma errada de fazer política, lembrando o IRA na Irlanda ou a ETA em Espanha.
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Teria sido mais fácil para a Irmandade Muçulmana ter copiado o modelo turco, que foi, até há bem pouco tempo, um excelente exemplo da compatibilidade entre o secularismo, a democracia e o Islão, ou não fosse o AKP de Recep Erdogan, um partido de inspiração neste movimento religioso. Se tiveram pouco tempo para o fazer, é também uma verdade, mas pelo menos deveriam ter tentado, o que não aconteceu, quer no Egito como na Tunísia.

IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
09/08/13

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