16/08/2013

JOSÉ MANUEL MEIRIM

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Presidente da República, justiça e desporto: 
de novo?

1. Alguns leitores estarão lembrados do apelo que aqui fizemos ao Presidente da República para que requeresse ao Tribunal Constitucional a fiscalização preventiva da constitucionalidade do decreto da Assembleia da República que tinha aprovado a criação do Tribunal Arbitral do Desporto. O apelo foi motivado por fundadas dúvidas que tinha quanto à constitucionalidade de algumas das normas aprovadas pelo Parlamento e, em particular, pela instituição de uma arbitragem necessária em conflitos de natureza pública, com total exclusão do acesso aos tribunais e de uma tutela jurisdicional efectiva.
2. O Presidente da República solicitou essa apreciação e o Tribunal Constitucional, numa votação que não deixou margem para dúvidas – embora a maioria parlamentar venha sempre falando em “por maioria”, numa demagógica tentativa de ganhar algum espaço de dúvida –, considerou que essa arbitragem necessária, como desenhada para o Tribunal Arbitral do Desporto, violava mesmo a Constituição da República Portuguesa (é uma chatice haver este texto). Não se olvide que, desta forma, “morreu” também um claro e semelhante propósito do Partido Socialista que, neste aspecto, engrossava a maioria parlamentar.
3. Os “moços”, contudo, não desistiram. Assim, o PSD e o CDS-PP vieram a apresentar alguns remendos ao decreto inconstitucional, procurando remendar aquilo para o qual, durante meses, tinham sido sobejamente alertados (e também o Partido Socialista). Tais emendas vieram a ser aprovadas, agora com os votos contrários da oposição parlamentar, escudando-se Laurentino Dias na ideia de que agora tudo mudou (após o acórdão do Tribunal Constitucional) e ainda que lhe subsistem dúvidas quanto ao erradicar das inconstitucionalidades afirmadas pelo Tribunal Constitucional.
4. Centremo-nos, de novo, na arbitragem necessária. Ponto de partida. Ela mantém-se inalterável, enquanto prevista nos artigos 4.º e 5.º da Lei do Tribunal Arbitral do Desporto. O que muda, então, neste novo decreto da Assembleia da República? Haverá recurso das suas decisões para os tribunais administrativos de segunda instância? Não. O que agora se prevê é um recurso especial (e excepcional) de revista das decisões do TAD para o Supremo Tribunal Administrativo. O que se afirma agora, no artigo 8.º, n.º 2, é que das decisões do TAD, “pode haver recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no Código de Processo nos Tribunais Administrativos quanto ao recurso de revista”.
5. Estamos, pois, como uma simples leitura permite apreender de imediato, perante uma possibilidade de recurso sujeita ao preenchimento de determinados requisitos que revelam a sua excepcionalidade. Não nos deparamos, nesta solução, com um recurso, “puro e duro”, para obter uma decisão contrária à alcançada pelo TAD. Apenas em alguns casos limitados, “saltando” pela segunda instância, se permite uma apreciação pelos tribunais.
6. Reparou-se a inconstitucionalidade declarada pelo Tribunal Constitucional? Pensamos que não. Terá o Presidente da República a paciência necessária para, de novo, se preocupar com esta matéria e enviar este decreto ao Tribunal Constitucional? Esperemos que sim. Todavia, antecipe-se, seria algo digno de registo, em face das circunstâncias. Se o Presidente da República mirar a norma atrás referida, encontrará, por certo, “uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental”.
7. Duas preventivas? Difícil e uma verdadeira aposta no cansaço (em época estival), da maioria parlamentar.

 Professor de Direito do Desporto

IN "PÚBLICO"
16/08713

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