23/05/2013

ANA SÁ LOPES

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Dos rituais 
e dos confortos em família


Precisa Cavaco de um respaldo para o respaldo que deu ao governo?

Boa parte dos rituais não serve para mais nada senão para conjugar o sentimento de fazer parte de uma comunidade. É assim com 99,1% dos rituais políticos, como a inauguração, a apresentação, a convocação e a reunião. O conclave de Estado do fim da tarde de ontem significa, para o futuro do país, a mesma coisa do que um almoço de domingo em família. Varre-se a sala do Conselho de Estado, limpam-se as pratas, areja-se e o Presidente, formalmente, dá início ao convívio. Não será mais do que isto que estará em causa.
O Presidente sabe o que pensam todos os conselheiros de Estado para que não lhe faça falta nenhuma reunião formal para o saber. Uma boa parte deles afirma com grande frequência e sem medos as suas opiniões em variados órgãos de comunicação social. Um dos conselheiros, Marcelo Rebelo de Sousa, chegou mesmo a admitir que o Presidente escolheu este tema - o futuro pós-troika - para se poupar a falar do triste presente e não contribuir para aumentar as "tensões". Quando é um conselheiro a admitir que o Presidente convoca uma reunião do Conselho de Estado para não falar da crise - com o argumento de proteger o governo ou a sua "coesão" - está tudo dito sobre a real importância do dito órgão.
O Conselho de Estado foi criado quando o Conselho da Revolução - uma herança dos tempos revolucionários incompatível com uma democracia civilista - foi extinto, na revisão constitucional de 1982. Depois inventou-se isto - um órgão de consulta do Presidente da República para usar em situações tão graves como uma declaração de guerra ou a demissão de um governo. 

Mas, em tempos recentes, as reuniões do Conselho de Estado transformaram- -se em jantares de família - frugais, a avaliar pela ementa do de ontem, uma "sopinha" e uma sanduíche -, cujo resultado prático para o futuro do país é igual a zero. Quer Cavaco Silva reestabelecer pontes com António José Seguro, previsivelmente o homem que governará o país no pós-troika e inventou um Conselho de Estado para isso? É uma teoria borbulhante. Precisa Cavaco Silva de um "respaldo" do Conselho de Estado para o ?respaldo? que deu recentemente ao governo ainda em funções? É o mais provável. E assim passa o Conselho de Estado de órgão de aconselhamento do Presidente da República para órgão de conforto do Presidente da República. 

Um dia destes, os media em conjunto acabarão por concluir que um Conselho de Estado destes não é notícia - mas ontem não foi a véspera desse dia.

IN "i"
21/05/13

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