09/04/2013

ANA CRISTINA CORREIA GIL

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Uns copos a mais

Faz-me muita impressão sair à noite e ver miúdos de 12, 13 anos (quando não menos) a beber desalmadamente em bares e discotecas. Pergunto-me sempre se os pais saberão o que ali se passa. Das duas, uma: ou sabem e deixam passar, ou não sabem e deviam averiguar.

Todos sabemos que não é fácil ser adolescente. A procura de si próprio, a consolidação da identidade, a afirmação de um lugar no grupo, na escola, são apenas alguns dos engulhos com que os mais novos se deparam na longa viagem que os leva até à idade adulta. São muitas as pressões para experimentar coisas novas, sob pena serem excluídos pelos seus pares. Muitos veem-se entre a espada e a parede, cedendo ao temor de serem considerados “fraquinhos” e “choninhas”. É assim que começam nos primeiros copos, uma cerveja aqui, um “shot” ali, e à primeira careta acaba por suceder-se o hábito em que já nem se repara.

A agravar este cenário está o facto de o álcool ser uma droga socialmente aceite em Portugal. Em algumas famílias, há até o hábito tolo de dar a experimentar às crianças bebidas alcoólicas, como se não houvesse nada melhor para elas começarem a consumir em dias de festa. Sobretudo no caso dos rapazes, há muito a ideia absurda de que o “fazer-se homem” passa por aprender a beber, geralmente a típica “cervejinha”. Raros são os homens que admitem não gostar de cerveja, já repararam? Isto deve querer dizer alguma coisa.

O facto é que já ninguém ignora os malefícios do álcool para qualquer ser humano. Mas a coisa torna-se mais grave quando se trata de jovens, alguns ainda imberbes, que já bebem mais do que muitos adultos. Foi também a pensar nestes casos que o Governo da República aprovou agora uma nova lei do álcool, segundo a qual os jovens entre os 16 e os 18 anos só podem beber vinho e cerveja. A proposta inicial era de que toda e qualquer bebida alcoólica fosse proibida até aos 18 anos. O que fazia muito mais sentido, já que o efeito nocivo tanto é causado pelo vinho, pela cerveja, como pelas chamadas bebidas “brancas”. Mas mais uma vez o poder do dinheiro e das cervejeiras (já que a cerveja é uma das bebidas de maior consumo nestas idades) falou mais alto e o Governo recuou, incompreensivelmente.

Claro que a promulgação da lei não chega. Há uma evidente falta de fiscalização no que aos bares e discotecas diz respeito, o que se torna gritante assim que se entra num destes estabelecimentos: apesar da proibição, são às dezenas os miúdos que por lá andam muito abaixo da idade permitida. É mais fácil entrar numa discoteca e consumir álcool sem se ter idade para isso, do que estacionar dez minutos sem colocar moeda no parquímetro sem ser multado.

Por todo o país se verifica esta situação, sem que ninguém se pareça importar. O que é certo é que cada vez são mais novos os clientes assíduos da noite, de copo na mão. Assustadoramente mais novos. E é lógico que quanto mais cedo se começa a beber, mais probabilidade se tem de criar dependência.

Detesto fundamentalismos. Mas neste caso não é disso que se trata. Trata-se, sim, de preservar a saúde das futuras gerações. Trata-se de acautelar mazelas que lhes estarão certamente guardadas se não houver tino nos adultos de hoje


IN "AÇORIANO ORIENTAL"
08/04/13

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