14/11/2012

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HOJE NO
"PÚBLICO"

Mulher morreu em hospital irlandês que 
lhe recusou terminar gravidez inviável

 “Este é um país católico”. Terá sido com estas palavras que os médicos do hospital de Galway, na República da Irlanda, negaram a Savita Halappanavar o aborto que lhe poderia ter salvo a vida. Grávida de 17 semanas, a dentista indiana foi informada que o feto não era viável, mas disseram-lhe que nada podiam fazer enquanto houvesse batimento cardíaco. Savita morreu uma semana depois, de septicemia. 

O caso extremo aconteceu no final de Outubro, mas só agora foi noticiado e bastaram poucas horas para ganhar dimensão de escândalo nacional. O país tem a lei mais restritiva de toda a União Europeia, autorizando apenas o aborto quando a vida da mulher estiver em risco – uma excepção que coloca todo o poder de decisão nos médicos assistentes.

Ainda na Índia, para o funeral da mulher, o marido de Savita contou ao jornal Irish Times que ela foi ao hospital a 21 de Outubro, com fortes dores de costas e o médico que a assistiu disse-lhe que a gravidez não tinha condições para continuar. “Disse-nos que o colo do útero estava totalmente dilatado, que estava a perder líquido amniótico e que, infelizmente, o bebé não sobreviveria”, contou Praveen Halappanavar, acrescentando que lhes foi dito que “tudo estaria terminado em poucas horas”.

Mas o prognóstico não se confirmou e no dia seguinte, com fortes dores, a jovem indiana pediu ao médico assistente que, “já que não podiam salvar o bebé, induzisse o aborto”. “Mas ele disse-nos que, enquanto houvesse batimento cardíaco não podia fazer nada”. Cada vez mais fraca, repetiu o pedido no dia seguinte. “O médico disse que era essa a lei, que este é um país católico”, recordou Praveen. Savita ainda terá argumentando que não era irlandesa, nem católica, mas de nada lhe valeu.

O seu estado de saúde agravou-se nas horas seguintes. Tinha vómitos e febre. Desmaiou quando se levantou para ir à casa de banho. Preocupados, os médicos retiraram-lhe sangue para análise, mas só ao terceiro dia, depois de confirmarem que o coração do feto parara, fizeram o aborto. Savita saiu consciente do bloco operatório, mas horas depois seria transferida para a unidade de cuidados intensivos, onde acabaria por morrer três dias depois. A autópsia revelou que não resistira a uma septicémia.

Depois de conhecida a notícia, a Inspecção de Saúde ordenou a abertura de um inquérito ao caso e o Hospital de Galway recusou fazer mais comentários, alegando que tem também em curso uma investigação. Mas o caso promete reacender o debate sobre a necessidade de mudar a lei ou, pelo menos, de garantir condições para a aplicação da actual legislação. “Isto era uma emergência obstétrica que deveria ter sido tratada de forma rotineira. Mas os médicos abdicam de tomar decisões médicas óbvias por receio das potenciais consequências graves”, disse ao Guardian Rachel Donnelly, activista pró-escolha irlandesa.

Em 2010, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos concluiu que o Estado irlandês está a falhar na aplicação da sua própria lei, não criando condições para que as mulheres em situação de risco tenham condições para interromper a gravidez com segurança e em tempo útil. No país, a maioria dos médicos são objectores de consciência e outros receiam agir alegando que não dispõem de linhas de orientação clara.

Na sequência desta decisão, o Governo de centro-esquerda criou um grupo de 14 peritos para definir as condições em que é legal a realização do aborto e quais os procedimentos que os médicos devem seguir, mas ainda não foram divulgadas as conclusões do trabalho.

Para Savita e Praveen já é tarde. “Os médicos tinham tudo ao seu dispor e deixaram-na morrer. Como é possível deixar morrer uma mulher para salvar um bebé que vai morrer de qualquer forma. A Savita ainda podia ter tido mais bebés”, lamenta o marido.

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