25/06/2012

FILOMENA MARTINS


  

A Europa do Euro ao euro 

É sintomático que, nesta altura, a Europa continue a discutir o euro moeda e não o euro futebol. E sintomático que os principais jornais espanhóis deem menos páginas à hipótese de serem a primeira equipa a conquistar, consecutivamente, dois europeus e um mundial, que à dimensão do seu resgate e às dúvidas que subsistem sobre ele. É sintomático que em França e na Grécia não esteja toda a gente a discutir o futuro das seleções, mas sim as eleições deste fim de semana e o que elas significam para o futuro europeu. 

É sintomático que a Itália não tenha aberto a discussão sobre a validade do velhinho Pilro, mas sim sobre quando chegará a sua hora de também pedir ajuda externa. E até é sintomático que Angela Merkel não dê tréguas por estes dias passando o protagonismo a Mario Gomez e companhia, e opte por falar da solução para os bancos europeus. O futebol costuma proporcionar momentos de pausa nas tensões políticas e económicas. Mas não desta vez. E é por isso, por todos estes sintomas, que o alerta geral está ativado. Está provado que não podem existir soluções individuais para uma Europa em colapso, e que a crise já não é apenas uma coisa de países periféricos e endividados. Se cada caso é um caso, e se é preciso aplicar regras a quem nunca as cumpre, é ainda mais verdade que tem de ser encontrada uma solução global na próxima cimeira do euro, já depois do Euro. A Europa vai ter de olhar para si como uma equipa de futebol, em que cada jogador tem um peso, mas precisa de todos para funcionar. E para vencer. 

As jogadas da Esquerda 

Em fevereiro do ano passado, Francisco Louçã começou a perder o Bloco quando decidiu antecipar-se ao PCP e apresentar uma moção de censura ao Governo de José Sócrates antes de tempo. Jerónimo de Sousa esperou e conseguiu depois não só "apagar" Louçã na oposição como unir em sem redor toda a direita no chumbo do PEC que obrigou a eleições antecipadas. Agora, na véspera de Louçã partir para a Grécia para tirar partido de poder festejar com Alexis Tsipras a possível vitória dos radicais de esquerda da Syriza, Jerónimo de Sousa decidiu antecipar-se a apanhar essa onda de esquerda: apresentou de surpresa a primeira moção ao Governo de Passos Coelho. 

Uma moção inconsequente nos resultados, mas que ninguém pode dizer que não é consequente na sucessão de críticas com que os comunistas têm brindado a maioria e que se vão traduzir em protestos até ao debate do estado da Nação. E que tem ainda o condão de limitar a ação do PS de Seguro. A jogada política é boa. Mas se os portugueses também mostrarem saturação dos partidos tradicionais, se for chamada a assumir responsabilidades, a ser mais que do contra, a fazer parte da solução, estará a Esquerda disponível? 

A saga dos nomes do TC 

Mais de seis meses depois, ainda não foi ontem, ao contrário do anunciado, que o PS se entendeu com o PSD sobre o nome que tem de apresentar para o Tribunal Constitucional. A saga, bem pior do que uma qualquer sequela de quinta categoria, e durante a qual só o CDS conseguiu propor um nome acima de qualquer dúvida, já incluiu figuras de relevo nas estruturas partidárias mas sem credenciais para o cargo, como se estivéssemos a discutir um chefe de distritais; e até um juiz conhecido por uma cossentença no mínimo estranha sobre um caso de abuso de menores. Quando a política trata assim um dos órgãos mais importantes na soberania do Estado, obriga os cidadãos a questionarem-se sobre quem lidera estruturas com menos peso institucional, mas igualmente relevantes e fundamentais para o funcionamento do País. 

 A vigilância da pedofilia 

A proposta da ministra da Justiça para criar um sistema de referenciação de pedófilos, à imagem do que já se faz nos EUA e em Inglaterra, encerra muitas interrogações e exige inúmeros cuidados. A primeira reação, a mais popular, perante as penas e o controlo de um crime hediondo, é o aplauso à intenção de Paula Teixeira da Cruz. Mas isso é o mais fácil. O difícil é perceber os riscos da aplicação da medida ou estudar se não existem alternativas mais eficazes. 

Os cidadãos têm o direito de saber que um pedófilo condenado, após a pena cumprida, vive na sua rua? Se sim, também deveriam saber se vive lá um terrorista ou um serial killer, ou qualquer outro criminoso, certo? Aumentar as penas para os abusadores de menores, que pode e deve ser superior ao de certo tipo de homicídios, devia ser discutido. Entregar a vigilância desses abusadores, após o cumprimento das penas, às autoridades competentes, criando mesmo regras de acompanhamento psicológico ou impedimentos profissionais, pode e deve ser debatido. Mas não é aos cidadãos que cabe vigiar ex-condenados - sabendo-se que, justa ou injustamente, lhe irão criar problemas graves -, é ao Estado. A proteção das crianças deve ser uma função essencial de um país. Mas não com leis precipitadas, baseadas em dados escassos e aplausos populares.



 IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS" 
16/06/12 

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