06/04/2012

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HOJE NO
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Autonomia
Escolas que quiseram sair de baixo
.da saia da mãe não voaram muito
São 22 escolas que quiseram autonomia. A liberdade foi curta, mas aprenderam que para subir os resultados têm de copiar as empresas

Libertar-se do poder do Ministério da Educação, uma espécie de mãe controladora que impõe todas as regras, foi o que 22 escolas públicas ambicionaram há quatro anos: a tutela prometeu-lhes mais autonomia e em contrapartida exigiu que mantivessem ou subissem os resultados dos alunos. O contrato acaba no fim deste ano lectivo e chegou portanto o momento de fazer o balanço. Para boa parte dos directores destas escolas, a liberdade prometida foi curta e não os deixou voar muito mais alto. Há que reconhecer, no entanto, que se tratou de um processo que tiveram de atravessar para se sentir hoje mais bem preparados para quando a verdadeira liberdade entrar no ensino público. “Sabemos o que queremos, sabemos o que somos capazes de fazer e sabemos onde queremos chegar”, conta Margarida Violante, directora da Secundária João da Silva Correia, em São João da Madeira.

As escolas que aceitaram os contratos de autonomia ganharam alguns benefícios em relação a todas as outras, a começar pela vantagem de poderem recrutar os próprios professores. Cada uma pediu o que fazia falta. Em vários casos, houve psicólogos e assistentes sociais para acompanhar os alunos, autonomia para gerir tempos de aulas, liberdade para reorganizar departamentos curriculares ou autoridade para criar projectos de apoio aos alunos.

Tudo isso foi útil, esclarecem os directores, mas a maior parte das escolas tinha expectativas altas: “Gostaríamos de ter mais margem de manobra para, por exemplo, gerir o nosso orçamento”, diz Margarida Violante. As verbas dependentes de autorizações mensais da tutela impedem que as escolas planeiem a longo prazo: “Quando lançámos um projecto nunca sabemos se vai ter continuidade nos anos seguintes.”

No dia-a-dia, a autonomia “não se traduz em nada”, explica José Lemos de Sousa, da Secundária Eça de Queirós (Póvoa de Varzim). Há que admitir porém que houve margem para gerir áreas não curriculares, reforçar o apoio ao estudo ou criar ofertas específicas: “Só que queríamos mais. Queríamos, por exemplo, de- senvolver iniciativas e ter autonomia para determinar o tempo dos professores para se dedicarem a estes projectos.”

As escolas com autonomia tiveram “mais fama que proveito”, alerta José Ramos, da Escola Secundária João Gonçalo Zarco, em Matosinhos. Para definir o número de alunos por turma, gerir o tempo dos professores ou fazer alterações nos cursos profissionais, a última palavra continua a ser da administração central. Nem sequer a possibilidade de escolherem os seus professores é uma mais-valia, conta José Lemos de Sousa: “Essa vantagem transformou-se em prejuízo.” As escolas com contrato de autonomia só podem recrutar os seus docentes depois de todas as outras terem colocado os docentes através do concurso nacional: “Acabamos por ficar com os professores que sobram, com aqueles que têm menos experiência e com classificação mais baixa.”

A autonomia foi “muito limitada”, esclarece o director da Secundária Santa Isabel (Estremoz), mas a experiência serviu para descobrirem que as escolas, em parte, são como empresas ou multinacionais que precisam de definir metas, desenvolver estratégias, cumprir objectivos e atingir resultados. A linguagem pode parecer calculista, tendo em conta que se trata do sucesso escolar de crianças e adolescentes.

É ao identificar pontos fortes e fracos que se torna possível “saber para onde se quer ir e o que é preciso fazer para lá chegar”, conta José Carlos Salema, explicando que a simples iniciativa de criar um gabinete de estatísticas foi como um “acto mágico” para monitorizar os resultados e saber onde agir. “Quando a escola se conhece e se organiza com o objectivo de identificar e resolver os próprios problemas está a tornar-se autónoma”, resume Fernando Elias, do agrupamento de escolas de Colmeias (Leiria). Ambicionar mais liberdade será sempre uma ilusão enquanto a tutela não abdicar do poder, diz José Lemos de Sousa, mas “a autonomia é uma construção que ainda agora começou”.


* Como se pode proporcionar uma verdadeira autonomia se a prestação financeira é feita em duodécimos? Poeira nos olhos já chega a que vem do norte de África.


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