A China tem razão
em abrir devagar
A próxima grande crise financeira global vai emanar da China. Não é uma previsão infalível, mas poucos países conseguiram evitar crises depois de um processo de liberalização financeira e de integração global.
Basta pensarmos nos EUA na década de 1930, no Japão e na Suécia no início dos anos 90, no México e na Coreia do Sul em finais da década de 90 e nos EUA, Reino Unido e grande parte da zona euro no presente. Poderá a China ser diferente? Só se os políticos chineses refrearem a sua prudência, bem visível no relatório do Banco Popular da China, divulgado na semana passada, no qual recomenda acelerar a abertura do sistema financeiro chinês.
O plano define três etapas para a implementação da reforma. A primeira deverá ter lugar nos próximos três anos, preparando o terreno para o reforço do investimento chinês no estrangeiro, o qual dispõe de mais espaço dada a contracção da banca e das empresas ocidentais, sendo, por isso, apresentado como uma "oportunidade estratégica". A segunda etapa, dentro de três a cinco anos, visa acelerar a concessão de créditos ao exterior em moeda chinesa. A longo prazo, isto é, dentro de mais cinco a 10 anos, os estrangeiros poderiam investir no mercado imobiliário chinês, bem como em acções e obrigações denominadas em renminbi. A conversão livre do renminbi, "o último passo", seria dado em data indefinida, porém, em combinação com restrições aos fluxos de capital "especulativos" e ao crédito estrangeiro a curto prazo. Resumindo, a integração plena seria adiada ad infinitum.
Como é que o Banco Popular da China pretende conciliar as iniciativas em prol de uma abertura com uma reforma tão cautelosa? Presume-se que a saída de capitais equacionada para os próximos cinco anos substitua, em parte, a acumulação de reservas em moeda estrangeira. Mas se a China também avançar para uma subida na taxa de juro real, as poupanças e os excedentes da balança de transacções correntes poderão explodir, agravando os desequilíbrios externos.
A parada é alta no que respeita ao papel que o mundo terá na reforma da China e na abertura do seu sector financeiro. A taxa de poupança bruta está acima dos 3 triliões de dólares, ou seja, mais de 50% das poupanças brutas dos EUA. É, pois, forçoso que a integração plena destes vastos fluxos tenha forte impacto global. As instituições financeiras chinesas, já de si gigantescas, vão tornar-se as maiores do mundo na próxima década. Basta pensarmos na integração do Japão nos anos 80 e subsequente implosão financeira para identificarmos potenciais perigos. Por esta razão, deveríamos estar gratos pelo facto da China ter adoptado uma abordagem cautelosa.
O Banco Popular da China propõe um calendário para as reformas que o seu país e o mundo necessitam. No entanto, para que isso aconteça, é preciso começar desde já a debater as respectivas implicações. As políticas da China não dizem respeito apenas aos chineses. É isso que significa ser superpotência.
* Sustaining China's Economic Growth After the Global Financial Crisis, Peterson Institute for International Economics, 2012.
Colunista do Financial Times
IN "DIÁRIO ECONÓMICO"
02/03/12
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