03/03/2012

MARIA d'OLIVEIRA MARTINS


O caminho 
    para o crescimento económico


A OCDE chama a atenção para os mais desfavorecidos, para que as reformas não prejudiquem os mais pobres

A expressão “crescimento económico” tornou-se num soundbite omnipresente no discurso político e jornalístico. A ideia de crescimento económico é tão irresistível que nos chega a ser oferecida sem qualquer espécie de conteúdo, ou, o que é pior, como incompatível com o equilíbrio das contas públicas – como se esta não fosse uma necessidade, mas um mero capricho.
Para ter uma ideia concreta do que esperar do “crescimento económico”, é muito útil a leitura do Relatório da OCDE divulgado no final da semana passada Economic Policy Reforms 2012 – Going for Growth. Neste documento encontram-se descritas as medidas que podemos esperar e em que devemos apostar, tendo em vista um crescimento de longa duração baseado em elevada produtividade e utilização de trabalho.

Em concreto, quando a OCDE fala de medidas de crescimento refere-se essencialmente a reformas laborais, fiscais e relativas ao mercado de bens. No que toca ao mercado de trabalho, considera favorecedoras de crescimento as medidas que flexibilizem as regras laborais; aumentem a qualidade e a equidade na educação secundária; visem a formação de desempregados mantendo a sua actualização; promovam a integração das mulheres e dos imigrantes na vida activa; encorajem a permanência e o regresso ao mercado de trabalho; e fomentem uma mobilidade indispensável a um aproveitamento mais racional dos recursos disponíveis.

Tendo em vista uma fiscalidade para o crescimento, recomenda medidas que ao mesmo tempo aumentem a receita fiscal e aliviem a carga fiscal laboral, incentivando assim a poupança e o investimento (promovendo aumentos por exemplo sobre bens imóveis ou na tributação ambiental). No que toca ao mercado de bens, sugere uma aposta em sectores protegidos de forma a fazer crescer o emprego.

Uma nota para dizer que a OCDE chama a atenção para o cuidado com os mais desfavorecidos, para que as reformas não prejudiquem os mais pobres. Neste sentido, sugere, por exemplo, o fomento temporário do emprego de curta duração para aliviar o impacto de uma conjuntura de fraca actividade, impedindo que as famílias caiam na pobreza.

Ao contrário da opinião generalizada de que não estão a ser tomadas medidas que visem o crescimento económico, a OCDE anuncia que a “boa notícia é que os governos estão a actuar agora com mais força na frente estrutural do que fizeram antes ou no início da crise”. No caso português, a avaliação não o deixa ficar mal: a OCDE reconhece o esforço que tem sido feito, desde 2007, na implementação das medidas recomendadas, muitas delas com aprofundamento em curso para cumprimento do MoU, embora recomende mais atenção ao mercado de trabalho, ao subsídio de desemprego e à ampliação da base tributária.

Há porém um aspecto a considerar: é que quando a OCDE fala das medidas de crescimento económico não esquece que estas nunca podem deixar de ter em vista a promoção da sustentabilidade financeira. Ou seja, devem sempre vir acompanhadas de um esforço de redução da despesa pública, falando em concreto da necessidade de reestruturação do sector público e da redução da despesa fiscal e de um esforço de ponderação nos aumentos de receitas necessários. E em Portugal o crescimento económico tem sofrido com os efeitos do ajustamento financeiro (referindo-se às dificuldades de resposta na resolução do problema crescente do desemprego de longa duração, v. a nota do Departamento de Política Económica da OCDE – Persistence of High Unemployment: What Risks? What Policies?). Se, por um lado, não há dúvidas que depois desta crise Portugal terá instrumentos favorecedores de crescimento económico, por outro, enquanto ela não passar, os constrangimentos orçamentais são tão elevados que limitam a capacidade de contrariar a falta de crescimento.

Docente na Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa

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01/03/12


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