31/03/2012

HELENA CRISTINA COELHO



Os inimigos de Gaspar

As agências de ‘rating’ dão notas (e dores de cabeça) a muitos e bons bancos, empresas e países. Mas não dão tréguas a nenhum.

Não é preciso recordar todos os efeitos secundários de uma má notação da Fitch, S&P ou Moody's: descer nas suas classificações é meio caminho para se cair em desgraça e perder a confiança de parceiros e investidores. Portugal não escapou à maldição desta intocável ‘troika' das notações. 
As sucessivas desvalorizações com que castigaram a economia portuguesa no último ano, mesmo quando o País já estava em dieta orçamental, são disso um sinal. Um sinal muitas vezes excessivo, fora de tempo, que se repetiu uma vez atrás da outra, já com o País atirado ao tapete e impedido de se erguer. 
Cada nota de ‘rating' lançada ao País tem sido como uma roda de cimento atada aos pés de um náufrago: por mais que esbraceje para chegar à tona de água, é sempre puxado para o fundo do rio. Vítor Gaspar sabe que as agências não lhe dão tréguas - mas nem por isso deixa agora de lhes colocar um travão. Quando a respeitável Fitch alertou o mundo esta semana de que (atenção!) o PIB português vai encolher 3,7% este ano, que o Governo vai ter de aplicar mais austeridade (medo!) e que (cuidado!) o risco de derrapagem no caminho para a meta do défice orçamental é grande, o ministro das Finanças reagiu com desdém diplomático: "A opinião da Fitch é respeitável, mas não estou de acordo". É provável que o ministro das Finanças tenha pensado em muitas outras respostas menos polidas para dar às previsões da Fitch. Mas preferiu atirar-lhes com os resultados da última avaliação do programa de ajustamento e com o progressivo nível de confiança dos mercados na reabilitação nacional. 
O problema, e é bom que Vítor Gaspar saiba disso, é que não bastam as boas notas da ‘troika' para contrariar as (pouco amigas) agências de ‘rating'. Faltam pouco mais de 500 dias para Portugal regressar aos mercados e, até lá, o Governo português tem de inverter rapidamente esta espiral de queda do investimento e do consumo, e de aumento da despesa pública e das medidas de austeridade. Cansados por tantos castigos, os portugueses estão impacientes. Porque eles, mais do que ninguém, estão a cumprir um penoso programa de ajustamento há mais de um ano. E ainda não vêem resultados dessa difícil relação entre sacrifícios pessoais e impacto nas contas públicas. Vítor Gaspar governa assim entre (potenciais) inimigos: de um lado, o mercado que o vai penalizar se falhar as metas; do outro, os portugueses que lhe vão cobrar altos juros se, no final, não virem a recompensa por tanto esforço.


Subdirectora


IN "DIÁRIO ECONÓMICO
29/03/12

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