26/03/2012

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HOJE NO
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Crise trava divórcios. 
Unidos pelas dívidas

Marta já tentou ir viver com os pais para conseguir fazer face aos encargos acrescidos que surgiram depois do divórcio. Foi ela quem o pediu, quando a rotina e a saturação tomou conta do casamento, o marido frente à televisão desde o regresso do emprego até se deitar. Farta de tentar mudá-lo, mudou-se. Já nem a terapia de casal ajudou, talvez porque a ansiedade pela liberdade era muito maior. Mas acabou por aceitar o convite do marido e ficou ela na casa comum. Já divorciada, fez a festa durante alguns meses, regressando aos tempos de jovem solteira.

Até que foi forçada a aterrar na realidade crua: despesas novas e as de sempre, agora todas a saírem do seu bolso, como o empréstimo da casa. Um pesadelo. Deprimida, em parte também porque semana--sim, semana-não ficava sem os três filhos numa casa vazia, atrasou a entrega de trabalhos e começou a receber menos encomendas, logo menos rendimentos. Viver com os pais parecia ser a solução perfeita mas acabou por também não se conseguir adaptar. Actualmente, procura entender-se com o ex-marido. Ponderam mesmo voltar a viver juntos.

Divórcios caem 7% O número de divórcios decretados em Portugal caiu quase 7% em 2011. Isto quando no ano anterior se tinha registado um crescimento de 5,3%. Na opinião de especialistas ouvidos pelo i, o factor crise pode ser o responsável pelo adiamento de muitas destas situações de ruptura. Uma separação implica sempre um aumento de despesas para ambos os elementos do casal e este argumento, sobretudo nos tempos que correm, leva cada vez mais pessoas a coibirem-se de avançar com a separação, adiando a decisão para melhores dias.

“Um casal contrai dívidas para obter, por exemplo, casa própria, contando com o vencimento dos dois. A partir do momento em que se separa, um deles vai assumir o imóvel e muitas vezes não tem capacidade financeira para suportar o empréstimo”, disse ao i Cristina Dias, docente em Direito da Família e das Sucessões da Escola de Direito da Universidade do Minho.

Ou seja, mesmo que decidam divorciar--se, os dois acabam por permanecer ligados pelos empréstimos contraídos em conjunto ou quaisquer outros compromissos financeiros assumidos por ambos. “Tenho relatos de advogados que dizem que determinados processos de divórcio acabam por não avançar porque as pessoas coabitam na mesma casa, debaixo do mesmo tecto, embora com vidas separadas”, acrescenta Cristina Dias. E evoca casos concretos. “Às vezes a situação arrasta-se ad aeternum. E até conheço realidades em que as pessoas partilham o mesmo apartamento mas fazem vidas totalmente diversas, dormem até em quartos diferentes, porque a situação a isso as obriga.”

Cristina conhece outros exemplos em que, apesar de ter sido tomada a decisão de se vender a casa, o casal acaba por ser confrontado com a barreira do mercado imobiliário, pois é cada vez mais difícil alienar imóveis. E enquanto não conseguem vender, “mantêm-se ali, no limbo, presas uma à outra”, constata a docente.

Há ainda um outro tipo de situações: quando existem filhos e um dos progenitores fica em casa com as crianças, embora o outro, tendo saído, continue a assegurar o pagamento do empréstimo. Solucionar este tipo de problemas exige, de alguma forma, uma maior maturidade e algum espírito de sacrifício por parte de quem continua a pagar sem usufruir do espaço.

“Há dívidas contraídas no decurso de um casamento, que embora tenham sido feitas por apenas uma das partes, acabam por responsabilizar os dois cônjuges. As dívidas mais significativas, contraídas perante a banca, responsabilizam sempre os dois”, frisa esta professora da Universidade do Minho, que escreveu a sua tese de doutoramento sobre a responsabilidade dos cônjuges perante dívidas.

Mafalda Vaz Pinto, advogada com uma longa experiência na área dos processos de divórcio, diz ao i que não tem notado “uma diminuição significativa de pedidos de divórcio”. Admite porém que a crise é travão. Pelo menos para aqueles que conseguem encontrar alternativas: “alguns vão viver para casa dos pais para economizarem nos custos com advogados. Mas se estão determinados a divorciarem-se, não permanecem juntos por causa da crise”, acrescenta a advogada.

“A menos que sejam forçados pelas dívidas a adiar o processo”, ressalva, no entanto, Cristina Dias. “Pode ser resultado de uma ponderação que leve a concluir que adiar o divórcio possa ser a decisão mais viável, pelo menos por algum tempo.

Ou seja, em Portugal, e em 2012, começa a ser mais difícil dissolver um casamento do que pôr fim a um contrato de trabalho. Que é como quem diz custa menos a uma empresa despedir um trabalhador do que a um marido ou uma mulher mandar embora a cara metade.


* Aturam-se porque estão tesos, que grande maldade.

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