28/03/2012

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HOJE NO
"DIÁRIO  DE NOTÍCIAS"

Seca e desinvestimento
 comprometem Vale do Lis

No Vale do Lis, planícies férteis dos concelhos de Leiria e Marinha Grande, está a assistir-se à soma da falta de água nos campos à inexistência de investimento no sistema de regadio público.

Promessas não cumpridas, contudo, ensinaram os responsáveis pelo regadio no Vale do Lis a desconfiar dos anúncios de milhões de euros para requalificar um sistema em decadência.

O presidente da Associação de Regantes e Beneficiários do Vale do Lis (ARBVL), Uziel Carvalho, desabafa: "era deitar tudo abaixo e fazer de novo", acrescentando que todo o sistema de rega, que data do final da década de 1950, "já era velho quando foi feito e hoje está perfeitamente caduco".

Da lista de deficiências, há duas visíveis: o desperdício de água, que ronda os 50%, e o facto de o sistema não permitir a mecanização da rega. Enterradas nos campos, há ainda "condutas que estão todas podres", revela.

Por outro lado, faltam reservas de água e aquela que corre nos canais do regadio não chega a 40% das propriedades que ocupam os 2145 hectares do Vale do Lis.

Em 2011, a ARBVL viu esfumar-se um projeto de reconversão do Açude das Salgadas, no valor de 1,2 milhões de euros. Havia fundos comunitários garantidos, mas por cá faltou o dinheiro da comparticipação nacional, explica o engenheiro agrónomo Henrique Damásio, técnico da associação.

Já em 2006 se vivera uma história idêntica, com outro projeto, cujo investimento rondava os 25 milhões, com o qual ainda se julgou ser possível realizar melhoramentos no sistema de rega. Também ficou por cumprir.

Junto à sede da ARBVL há um "cemitério" de caleiras e pelas estradas dos Campos do Lis muitas são as que inspiram cuidados. Nos últimos dias, entre as valas que precisam de limpezas que demoram meses e as bocas de rega danificadas, os agricultores anteciparam, enquanto ainda há água, a cultura de hortícolas.

No Vale do Lis, dos 3636 proprietários, apenas três centenas de agricultores trabalham as terras. Filipe Varalonga, de 43 anos, explora quatro hectares e trabalha por conta própria desde 2000.

No seu terreno há espaço para couves, alfaces, pimentos e alho francês. Tal como Luís Miguel, que num terreno vizinho plantou 20 mil alfaces, está movido "pela fé" de que a seca não é para continuar e que a chuva não virá de uma só vez.

"Há alguns sítios mais enxutos, onde não arriscam plantar nada. O milho, mais tarde, sim. Nas hortícolas não. Mas eu tenho de plantar, mesmo que tenha de bombear a água e subir o custo de produção", explica Filipe Varalonga, ciente que perder clientes certos porque não arriscou produzir é abrir a porta à concorrência.

Luís Miguel espreitou as valas e sabe que estas já trazem pouca água. Tem 46 anos e há 17 que se dedicou à agricultura. Hoje investe em seis hectares, esperançado "que não falte água no rio" e que a chuva tarde, mas não falhe.

Admite que está a antecipar a plantação para minimizar prejuízos que venham à boleia da seca, mas lembra que na agricultura não há riscos, apenas a dúvida: "a gente sabe o que lança à terra, mas nunca o que colhe".

No Vale do Lis a seca já comprometeu 60% das pastagens que serviriam para alimentar os animais. Uziel Carvalho, que tem de alimentar todos os dias quase meio milhar de vacas, diz que este ano recolheu 160 toneladas de matéria verde, a partir dos 150 hectares onde cresceram sobretudo gramíneas. Em 2011, num ano de chuva, já tinha garantido 800 toneladas oriundas de uma área que ronda os 120 hectares.

Contudo, o maior agricultor daquela zona entende que há mais vida para além da chuva. "Combater o abandono das terras, promovendo o emparcelamento dirigido à exploração agrícola e não ao proprietário, criar mais dois açudes" - para garantir alguma reserva estratégica de água - são bons pontos de partida, admite.

O caminho para a sobrevivência da agricultura no Vale do Lis passa, diz, por esquecer os grandes projetos que ficam no papel e em apostar nos mais pequenos que se concretizam. "Mudar as coisas aos poucos", resume.


* O colapso da agricultura e das pescas vem do cavaquismo, os outros governos limitaram-se a tentar mudar as circunstâncias do óbito!


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