23/01/2012



HOJE NO
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Cavaco. Presidente recebe 
três mil euros para representação
Um ano depois de começar o segundo mandato, 
Cavaco e Passos estão cada vez mais distantes

A pergunta coloca-se desde sexta-feira: afinal que despesas tem o Presidente da República para que dez mil euros por mês brutos não cheguem? Mas não são dez mil, são quase 13 mil euros brutos. Além das reformas de quase dez mil euros, o Presidente da República recebe ainda 2900 euros por mês para despesas de representação pelo cargo que ocupa. Assim, a Presidência assegura a Cavaco, durante os próximos quatro anos, os gastos com alimentação, habitação, médico e outras despesas pessoais.

O Orçamento da Presidência da República prevê uma verba de 4,5 milhões de euros para 2012 na rubrica representação da República. Um valor que diminuiu desde 2009 e que inclui, além das despesas de representação do Presidente, as remunerações com o gabinete de Cavaco e as Casas Civil e Militar e ainda as remunerações pagas ao pessoal dos gabinetes dos anteriores presidentes da República. Uma benesse que também Cavaco irá ter depois de sair de Belém.

A dias de terminar o primeiro ano do segundo mandato na Presidência da República, Cavaco Silva cometeu a gaffe que lhe tem saído cara nas ruas. Em Guimarães, onde esteve para o arranque da Cidade Europeia da Cultura, o Presidente foi vaiado e conheceu o sabor amargo da contestação social como não se lembrava desde o buzinão da ponte em 1994. Se nos anos 90 respondia a críticas com a célebre frase: “Deixem-me trabalhar”, desta vez a Presidência da República opta pela estratégia do silêncio.

O episódio que deixou Cavaco debaixo de fogo culminou no entanto com a certeza que a relação entre Cavaco e Passos já teve melhores dias. O Presidente e o primeiro-ministro relacionam-se há pouco mais de seis meses enquanto mais altos responsáveis do país e os últimos tempos têm mostrado a distância entre os dois. Se na sexta, o Presidente cometeu a gaffe, no sábado, Passos, num gesto inédito, comentou as palavras do Presidente, ao mesmo tempo que dizia que não comentava. Dirigindo-se directamente ao Presidente – “O que eu quero dizer aos portugueses, a começar pelo senhor Presidente da República e a acabar em qualquer cidadão em Portugal” – Passos lembrou que “os sacrifícios têm de ser repartidos por todos” e que “vão valer a pena”. “Não há ninguém que fique de fora”, acrescentou.

A expressão utilizada por Passos remete para as palavras que meses antes Cavaco tinha dito sobre o Orçamento do Estado. A primeira divergência pública entre o chefe de governo e o chefe de Estado apareceu pouco depois da apresentação do Orçamento para este ano, o primeiro da era Passos Coelho. Na altura, Cavaco alertou que os sacrifícios pedidos aos portugueses tinham de ser repartidos igualmente por todos, uma vez que os cortes dos subsídios de férias e Natal a funcionários públicos e pensionistas violavam o princípio constitucional da equidade fiscal. O governo não lhe fez a vontade e manteve a proposta, apenas a aligeirou, ao aumentar o valor a partir do qual os cortes eram efectivos.

Paz podre Na semana em que assinou o acordo na Concertação Social, Passos teve uma ajuda extra de Belém. As atenções mediáticas viraram-se para as declarações do Presidente. Mas foram as declarações de Passos uma estratégia para aproveitar o descuido presidencial? “Tomo a reacção do primeiro-ministro como uma resposta. Assim como o Presidente quer dar a impressão que não está a favorecer o governo, o primeiro-ministro também quer mostrar que não se intimida”, diz ao i o economista e ex-ministro de Cavaco Silva, Miguel Beleza. “Claro que Passos se aproveitou um bocado, até porque este ponto tinha sido um dos da discórdia antes do Orçamento do Estado. Agora, depois da discórdia, Passos aparece como o arauto da moralidade”, diz ao i um social-democrata que preferiu o anonimato. Já o antigo conselheiro de Estado do Presidente, António Capucho acredita que as declarações do Presidente e a resposta de Passos não vão criar mazelas no relacionamento entre os dois: “Não são crianças nem irresponsáveis. O problema do lapsus linguae ou da força de expressão usada pelo Presidente é irrelevante perante os problemas do país. Não vão debater-se nem deixar arrastar uma questão secundária”.

O Presidente, mais solto por não ter no horizonte eleições, tem mostrado por diversas vezes que não concorda com o rumo seguido em São Bento. Além dos cortes nos subsídios, Cavaco promulgou, mas com dúvidas, a primeira reforma de Passos Coelho: o fim dos governo civis. As divergências entre os dois colocam- -se ainda ao nível ideológico: Cavaco diz que inscrever um limite ao défice na Constituição “é estranho” e que reduzir a taxa social única “seria um erro”, duas ideias das quais Passos é defensor. Certo é que depois disto os dois terão de se entender por mais quatro anos, caso cumpram mandato até ao fim.


* E assim se faz a poupançazinha...


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