02/08/2011

PEDRO MARQUES LOPES



Os bons comissários políticos 
                                   são os nossos

É como o Sol nascer todos os dias: novo Governo, e lá temos a polémica sobre nomeações para empresas, institutos, fundações e demais organismos ligados ao Estado. Esta semana, foi a vez da Caixa Geral de Depósitos, outras se seguirão.

É bem verdade, foi-nos prometida uma redução no número de administradores nas empresas ligadas ao Estado: a CGD passou de sete para 11. Sabemos que o cargo de chairman duma empresa serve normalmente para gerir as relações com os vários accionistas: a CGD só tem um, não se entende assim o porquê do cargo.

Veio, e muito bem, a questão das incompatibilidades. Que este não poderia ser administrador por isto, que aquele não poderia ser por aquilo.

De todos os nomes falados, há apenas um onde me parece evidente a negligência na escolha e a falta de pudor na aceitação do cargo: Pedro Rebelo de Sousa. Não se percebe como é que um advogado que tem processos contra a CGD ou defende empresas com interesses conflituantes com este banco pode ser ao mesmo tempo administrador da firma e defensor da contraparte. Pior, vociferou ultimamente contra o tipo de situações em que agora está envolvido.

Quanto aos outros membros do conselho de administração, não consigo entender o rebuliço criado. São todos gestores experientes, com passagens por várias empresas e com uma vantagem não despiciente: toda a gente sabe donde vêm, o que fizeram, as suas relações empresariais. São amplamente sindicáveis. Mas, melhor, compreende-se a polémica, não é mais que luta política ou opiniões, absolutamente legítimas, sobre as qualidades profissionais ou pessoais dos nomeados. Nada de estranho.

O caso mais falado e criticado foi o de António Nogueira Leite. Também não surpreende. O economista e professor é uma figura que apareceu muitas vezes como autêntico porta-voz para assuntos económicos de Passos Coelho e tem opiniões nem sempre consensuais. Mas não é Nogueira Leite um gestor experiente? Não trabalhou em diversas empresas importantes? Queriam o quê? Um tipo qualquer que não tivesse trabalhado em organizações empresariais? Trabalhar num relevante grupo económico é cadastro? Que bom gestor português não trabalhou num dos, infelizmente, pouquíssimos grandes grupos empresariais portugueses? Por mim, não me importaria rigorosamente nada que o ministro Álvaro tivesse um centésimo da experiência empresarial de Nogueira Leite.

Para não fugir à rotina, lá veio a história dos comissários políticos. A coisa é absolutamente hilariante. Ouvir gente que sempre defendeu a permanência da Caixa nas mãos do Estado ficar muito revoltada por o Governo ter designado pessoas em quem tem confiança política é de ir às lágrimas.

Deixem-me adivinhar. Se fossem eles a nomear os administradores, escolheriam cavalheiros ou senhoras que tivessem opiniões radicalmente diferentes sobre a estratégia a seguir para a Caixa? É assim, não é?

A razão para uma empresa estar nas mãos do Estado é sempre política. Os critérios de gestão também.

Quem está à frente do Estado pensa que esta ou aquela empresa deve seguir um determinado rumo e contrata pessoas para seguir essas orientações.

Como em qualquer organização que o Estado domine, o objectivo é sempre a prossecução do interesse público. Ora, a definição deste conceito é simples: é o que os governantes acham melhor para a comunidade num dado momento. O interesse público, em democracia, é tão-só uma opinião legitimada por sufrágio universal. Colocar pessoas que não têm a mesma interpretação que o seu accionista (no caso da CGD, único) na gestão da empresa seria um perfeito contra-senso.

Quem sempre defendeu a manutenção da Caixa nas mãos do Estado não tem um pingo de legitimidade para se insurgir contra a nomeação de comissários políticos. Podem ficar aborrecidos por não serem os que eles nomeariam, apenas e só isso.

Quando forem nomeados os gestores, que, é claro, também serão comissários políticos, para as outras empresas públicas, os que andam muito incomodados podem ficar calados. São também eles que defendem estas regras.

Só há uma forma de a CDG não ser gerida em função de objectivos políticos: deixar de ser do Estado. Há quem pense que isso é de interesse público, mas essa não é a opinião deste Governo nem de quem critica as nomeações.

IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
01/07/11


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