10/08/2011

HELENA GARRIDO



A crise do preconceito e da incompetência

A Economia devia ser uma ciência social pensada em liberdade intelectual para resolver os problemas dos cidadãos. Mas não é.

Os senhores que dirigem o euro estão contaminados por preconceitos e preferências que nos condenam ao declínio e a esta crise que parece eterna.

Esta primeira semana de Agosto parece o regresso aos mais difíceis tempos de 2008, num quadro de maior fragilidade financeira e com a ameaça de se entrar numa guerra cambial e proteccionista que terminará com todos pior do que estão.

Depois de finalmente a Administração Obama ter sido autorizada a aumentar o limite da sua dívida, a catadupa de acções começou na quarta-feira, com o Banco Central da Suíça a reduzir a sua taxa de juro para zero e a anunciar um aumento da oferta de moeda. Objectivo da Suíça: combater a valorização do franco suíço, que se apreciou cerca de 10% face ao euro durante os últimos dois meses. Ontem foi a vez do Japão intervir no mercado cambial, também para moderar a subida do iene. Uma actuação feita, aparentemente, sem o aviso ou cooperação dos seus pares, como fez crer o presidente do BCE. Nesse mesmo dia de ontem, Jean-Claude Trichet anunciou que o Banco Central do euro irá reactivar a compra de obrigações de dívida pública e reforçar a ajuda aos bancos. E, embora sem uma relação que se possa perceber, as bolsas do outro lado do Atlântico entraram em processo de pânico, arrastando com elas os mercados europeus de capitais. O dia terminou ontem com os investidores de todo o mundo a fugirem das acções, com sinais de pânico, para se refugiarem em obrigações e em moedas como o franco suíço e o iene, que pouco ganharam com o combate das suas autoridades a este medo do dólar e do euro.

A mensagem que os investidores estão a transmitir é de medo de uma nova recessão nos Estados Unidos, quando ainda não se saiu da que foi alimentada pelas engenharias financeiras do crédito para quem é pobre.

O quadro actual poderia ser completamente diferente se a Europa, onde circula o euro, tivesse tido a coragem de se desamarrar dos seus preconceitos e tivesse já resolvido o problema de excesso de endividamento de alguns dos Estados-membros da União Monetária. Os problemas económicos e financeiros da Zona Euro são uma gota de água quando comparados com os autênticos buracos negros que o sistema financeiro abriu na economia norte-americana.

Washington está a usar, desde 2008, todo o tipo de ferramentas para reanimar a economia, mais aquelas que só a América, potência imperial, pode ter, como é o caso da desvalorização do dólar, a moeda em que estão os seus empréstimos concedidos pelo resto do mundo, com especial relevo para a China.
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Na Zona Euro, em Frankfurt, Berlim, Paris e Bruxelas, fazem-se reuniões de onde saem decisões que seriam óptimas se tivessem sido tomadas seis meses antes. Na Europa do euro, todos amarram as mãos de todos, para dizerem depois uns aos outros que as suas leis não permitem fazer o que o interlocutor está a pedir.

O euro podia ter nesta crise a oportunidade para se afirmar como uma potência no mundo. Mas não consegue. Quem o dirige ainda não percebeu que a mudança exige abertura de espírito. Quando o mundo muda, as regras impedem a flexibilidade necessária à adaptação ao novo regime. O combate sem tréguas à inflação e ao défice público deixa de ser racional e transforma-se em preconceito e incompetência. E é uma sentença para o declínio.

IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
05/08/11


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