As contas e a regionalização
O secretário de Estado da Administração Local lançou, ontem, um balde de água fria sobre os cerca de mil autarcas que estão reunidos em Coimbra, no XIX Congresso da Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Paulo Júlio, ex-autarca de Penela, informou os presentes de que a regionalização não está nos planos do Governo. Argumento: "Há um plano de emergência social que é preciso colocar no terreno, há um plano de emergência financeiro e um plano de emergência económica que é fundamental. A regionalização não é um tema que está na agenda".
Assim à primeira vista, a coisa parece fazer sentido: a urgência em pôr as contas em ordem e a economia a crescer; o facto de a troika nos ter imposto a sangue-frio uma redução substancial de freguesias e autarquias; a circunstância de as câmaras serem obrigadas a reduzir pessoal; e esse ligeiro problema decorrente do corte de 1200 milhões de euros de transferências do Estado para os municípios nos próximos dois anos - tudo parece aconselhar prudência e ponderação num salto tão delicado como é a criação de regiões.
Sucede que, ultrapassadas as primeiras e superficiais vistas, há, entre muitos outros, três factores que aconselham o contrário daquilo que defende o secretário de Estado.
Primeiro factor. A transição para um Portugal mais desafogado financeiramente não pode ser feita apenas e só com base na análise das colunas do deve e haver. Sim, essa lente é fundamental, mas não deve matar a política, aqui entendida no seu mais nobre sentido. E a política, creio, aconselha reformas que, mais cedo ou mais tarde, se nos imporão, como a regionalização.
Segundo factor. Politicamente falando, Passos Coelho prometeu (está escrito no projecto de revisão constitucional do PSD, artigo 255) criar uma região piloto para avaliar custos e benefícios e, lia-se nas entrelinhas, convencer os cépticos. O PSD queria mesmo eliminar a obrigatoriedade de criar regiões administrativas em todo o país e ao mesmo tempo. Uma de duas: ou era engodo, ou a vontade de (tentar) regionalizar passou-lhe depressa.
Terceiro factor. Mesmo mergulhada numa crise ainda mais grave do que a nossa, a Grécia criou regiões, vendo nelas um instrumento de modernização do país, de redução de custos na administração pública, de eliminação de assimetrias regionais e de impulso ao desenvolvimento económico. Estão loucos? Se sim, são acompanhados pelos restantes 12 países que, na Europa a 15, também têm regiões. Faltamos apenas nós e os irlandeses. Pode ser que os inteligentes sejamos nós e os irlandeses. Mas também pode ser que, um destes dias, fiquemos, outra vez, orgulhosamente sós.
É o nosso fado...
IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
10/07/11
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