07/07/2011

4 - ALMORRÓIDA ECOLOGISTA


Falta de água não é só um problema 
do Corno de África

por Marta F. Reis

A maior seca dos últimos 60 anos no Leste de África pôs 10 milhões de pessoas em risco de morrer de fome. O problema da escassez da água não é novo, e se no Corno de África está a ser agravado pelo fenómeno La Niña, as previsões são que as alterações climáticas venham a afectar os países na latitudes mais baixas mas também no Mediterrâneo. Basta pensar que, na última grande seca de 2005, os produtores nacionais perderam 60% do trigo e, segundo o último Water Stress Index, Portugal é já o terceiro europeu mais vulnerável. Os piores momentos fazem questionar a estratégia que nos últimos anos tem permitido às economias emergentes e do Médio Oriente (cada vez com menos água) escapar às crises alimentares.


A pior seca dos últimos 60 anos
É a primeira grande crise humanitária do século no triângulo Somália- Quénia-Etiópia. Depois das Nações Unidas terem alertado para o facto de haver 10 milhões de pessoas em risco de fome, a seca prolongada, já atribuída ao fenómeno La Niña, levou a uma escalada sem precedentes nos preços dos alimentos, que atinge de forma mais dramática a Somália. “Estávamos a prever o La Niña nos últimos seis meses – quando acontece, há secas no Leste e inundações no Sul”, explicou o economista da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) Shukri Ahmed, avisando que apesar dos alertas houve poucos planos de contingência postos em prática e os fundos para ajuda humanitária estão 40% abaixo do que seria necessário.
Dados de satélite citados pela USAID permitem estimar que a precipitação esta Primavera foi um terço da que seria normal. Os preços dos alimentos dispararam 270% e sobretudo na Somália há relatos de um êxodo sem precedentes. Todas as semanas chegam aos três campos de refugiados em Dadaab, no Quénia, mais de 1400 somalis. Metade das crianças estão em situação de subnutrição e são estimados 500 mortos.
Estes países não são particularmente vulneráveis à escassez de água, mas as mudanças nos padrões de precipitação podem gerar cenários de escassez em poucos meses. Como agravante, tanto o Quénia como a Etiópia venderam, nos últimos anos, terrenos agrícolas aos países do Médio Oriente e à China, em situações de maior pressão hídrica, cenário que, embora já tenha começado a ser discutido na última reunião dos G20, ainda não mereceu uma condenação internacional. Ontem a principal milícia somali levantou o bloqueio imposto em 2009 à ajuda humanitária, que considerava anti-islão. A Oxfam também lançou a maior campanha de sempre em África – quer juntar 80 milhões de dólares. A Comissão Europeia anunciou que vai enviar 8 milhões de dólares para a resposta humanitária no Quénia, montante a juntar aos 100 milhões libertados desde o início do ano.
Mesmo sem o fenómeno La Niña, os investigadores têm alertado para uma maior frequência de secas no Leste africano a par do aquecimento global. Um estudo publicado em Janeiro na revista “Climate Dynamics” estimava 17,5 milhões de pessoas numa situação de insegurança alimentar no Corno de África, alertando que o aquecimento do oceano Índico, que parece estar a agravar os efeitos do La Niña, é reflexo das alterações climáticas.



Portugal já é o terceiro mais vulnerável da Europa
Se no Corno de África a falta de água parece estar a ser acentuada pelas alterações climáticas, a escassez não é novidade e cada vez o problema é menos restrito aos países em desenvolvimento. O gabinete de comunicação da consultora internacional Maplecroft, que anualmente traça mapas de risco para as pressões sobre os recursos hídricos, revelou ontem ao i que este ano Portugal surge na 45.a posição no Water Stress Index, que avalia as pressões provocadas pelos usos domésticos, industriais e agrícolas sobre os recursos derivados do subsolo, dos rios e da precipitação anual. Segundo o porta-voz Jason McGeown, Portugal é já o terceiro país europeu com a situação mais vulnerável, atrás de Espanha e Bélgica (38.a e 40.a posição.) As regiões de maior risco parecem localizar-se na região de Lisboa e Vale do Tejo.
Nos últimos anos, organizações como o WWF (Fundo Mundial para a Natureza) têm alertado para o aumento das secas no Mediterrâneo – o que diminui parte dos recursos disponíveis em países como Portugal. Num relatório de 2006 esta organização não-governamental recordava os efeitos da seca no Verão de 2005, em que o país perdeu 50% da produção de trigo e 80% da produção nacional de milho.
Um alerta mais recente surgiu no último Dia Mundial da Água, em Março. Segundo o WWF, Portugal foi considerado, a par de Grécia, Itália, Espanha e Chipre, um dos piores países em termos de pegada hídrica, ocupando a sexta posição no ranking de 140 nações. Outra chamada de atenção foi para a qualidade dos rios portugueses: apesar do aumento das unidades de tratamento, sete são classificados de “muito maus.”

IN "i" (excerto de um importante artigo)
07/07/11

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