13/03/2011

RODRIGO TAVARES









O fracasso da governação global 
                              e a paradiplomacia

A globalização e, principalmente, a internet 
tornaram as populações cada vez mais exigentes

Desde o 11 de Setembro de 2001 que especialistas em Relações Internacionais não tinham tanto trabalho. As análises sobre as revoltas no mundo árabe tornaram-se torrenciais, imediatas e sensacionalistas. É verdade que o momento é histórico. É verdade que a queda, ao vivo, de ditadores provoca em nós reações epidérmicas. Mas chegará, em breve, o dia em que temos que nos preocupar mais com quem vem do que com quem saiu. Tunísia e Egito estão em convulsão interna, sem um aparelho de Estado que consiga ocupar os vazios de poder e responder às expectativas que foram criadas pelas manifestações. Mas isso deixou de ser notícia. As câmaras viraram-se para a queda de Kadhafi, na Líbia.

Se este é um momento histórico nas relações internacionais, não é apenas porque líderes árabes têm caído como peças de dominó. O que torna tudo tão distinto é que estamos a assistir à primeira crise global de governação do século XXI. O Estado, tal como o conhecemos e como foi fundado no século XVII, deu mais uma prova de que se encontra desajustado das necessidades atuais. O mundo árabe pode servir de fermento a várias mudanças com impacto global.

Em meados do século passado, diagnosticou-se o mesmo problema e a solução receitada chamou-se integração regional. Fundou-se a União Europeia e exportou-se o modelo para todas as regiões do mundo. Atualmente, dos 192 países membros da ONU, só Israel e Mongólia não estão integrados numa organização regional, política e económica. Mas as críticas têm abundado. A União Europeia, em crise, "deixou de se sentar à mesa do póquer internacional", como eu ouvi, no outro dia, o presidente da maior empresa distribuidora de bebidas na América Latina. E as outras organizações são frequentemente acusadas de se esgotarem em cimeiras anuais de Chefes de Estado ou de estarem arredadas da população. Quem conta com a União Africana para resolver os problemas locais e diários dos africanos?

A próxima solução para a crise de governação pode-se chamar paradiplomacia, que diz respeito à política conduzida por governos subnacionais, regionais, locais ou, simplesmente, não estatais, com vista à consecução dos seus próprios objetivos. Em vez de estar centrada no Estado ou em organizações regionais, a governação passaria a focar-se em espaços políticos menores, com maior proximidade à população. Muitas regiões do mundo - como São Paulo, Quebéc, Catalunha, Baviera ou Flandres - têm uma atuação global. O anseio popular por maior participação nas questões de caráter internacional impulsiona iniciativas locais de alcance global, tanto no âmbito social quanto no político. Regiões não substituirão Estados. Mas complementarão a sua ação, preenchendo espaços de governação que foram negligenciados pelos poderes centrais. A globalização e, principalmente, a internet tornaram as populações cada vez mais exigentes.

Coincidentemente, a Chatham House, um dos principais centros de reflexão política no Reino Unido, tem um debate marcado para a próxima semana para discutir este tema. Muitos se seguirão. Também em Tunis, Cairo e, em breve, em Trípoli se deveriam debater as melhores formas de governação para atender às necessidades da população. Precisamos de ser criativos. É uma oportunidade que definitivamente não pode ser desperdiçada.

IN "VISÃO"
03/03/11

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