10/03/2011

CONSTANÇA CUNHA E SÁ




O 'novo' Bloco


Já se sabia que o mundo do engº Sócrates muda radicalmente numa semana. Agora, ficámos a saber que o mundo do dr. Louçã muda inesperadamente em cinco dias
Há pouco tempo, quando o partido comunista anunciou vagamente uma moção de censura, o Bloco de Esquerda não perdeu muito tempo em análises: com uma sapiência digna de nota, declarou, desde logo, que uma iniciativa destas estava fatalmente condenada ao fracasso, não tendo, por isso, qualquer "eficácia". Cinco dias depois, e sem que nada de particular o justificasse, o dr. Louçã deu o dito por não dito, e, no meio de um debate mais acalorado com o primeiro-ministro, tirou da sacola uma moção de censura que, nas palavras do próprio, não teria também qualquer "eficácia". Aliás, temendo que a iniciativa pudesse, por artes mágicas, levar, de facto, à queda do Governo, o Bloco decidiu avisar os outros partidos com assento parlamentar de que a sua moção tinha a feliz particularidade de abranger não só o Governo como o resto da Oposição. Ou seja, temendo que o PSD considerasse que tinha chegado ‘o momento certo’ para correr com o engº Sócrates do poder, o Bloco sentiu-se obrigado a explicar o óbvio: que a sua iniciativa não era mais do que uma pequena manobra táctica que tinha como grande objectivo mostrar ao país que conseguia antecipar-se ao PCP e que tinha uma existência própria, apesar de ter andado de braço dado com o PS na candidatura de Manuel Alegre. Perante isto, que para o dr. Louçã, é o essencial, pouco importa que o engº Sócrates acabe por ser o único beneficiado de uma moção de censura que está, já, condenada à partida.
O episódio não seria mais do que uma palhaçada parlamentar se não tivesse tido o mérito de revelar aos mais distraídos o que é de facto o Bloco de Esquerda, desmascarando, de uma vez por todas, a velha ‘juventude’ que o lidera. Por mais que se queira disfarçar o óbvio, a ideia de um partido novo e livre dos vícios que contaminam todos os outros deixou de fazer qualquer sentido – embora se possa dizer que há muito que tinha deixado de o fazer. O problema é que, ao contrário do que acontece, por exemplo, com o PCP, onde cada dissidência é analisada ao pormenor, o Bloco tem gozado, até aqui, de uma complacência por parte da Comunicação Social, que ignora as suas divisões internas, ao mesmo tempo que o promove como um partido que se insurge contra um sistema do qual ele faz intrinsecamente parte. A partir de agora, é difícil que as coisas se mantenham assim.

IN "CORREIO DA MANHÃ"
18/02/11

Sem comentários:

Enviar um comentário