Impressão Digital
Testemunho
Ao longo destas décadas, jamais um director de qualquer das publicações com as quais tenho colaborado me pediu para calar este assunto, para evitar aquele outro. Pelo contrário. Recordo-me de um tempo em que a discussão sobre as prescrições de crimes do Fundo Social Europeu estava tão acesa e tão politicamente disputada que as posições foram fortes. Sabia que as minhas palavras atingiam o âmago do poder da altura, e por vezes duvidava da capacidade do jornal, na altura o ‘DN’, de suportar aquela guerra. Um dia telefonou--me o então director, Mário Bettencourt Resendes. Saudava a minha intervenção e assumia a sua solidariedade. Nunca mais deixei de o admirar profundamente pela coragem e pela independência jornalística.
Escrevo regularmente no ‘CM’ há vários anos. Por vezes com palavras rijas que julgo proporcionais ao assunto em debate. Sempre com a certeza de que não colhem unanimidades, mas sempre com a certeza de que o exercício de opinião ou é uma libertação da consciência ou então não é opinião livre e independente. Comecei neste jornal sendo director o João Marcelino, que sempre estimulou a minha liberdade sem a condicionar.
Agora, de há uns anos a esta parte, é o Octávio Ribeiro, amigo de velha data, homem de uma integridade impoluta que assumiu a liderança deste diário. Todos sabemos que os últimos anos têm sido complicados no que respeita à segurança e à justiça, e como escrever aquilo que se pensa conduz seguramente a desagrados. Umas vezes de uns, outras vezes de outros, e algumas situações são tão bizarras que precisam de palavras fortes. Em defesa da liberdade de expressão, dou o meu testemunho pessoal sobre a honradez destes homens e da vida democrática no nosso país.
Pode haver uma ou outra distorção? Eventualmente haverá. Como em qualquer país. Mas é indigno e insultuoso afirmar-se no Parlamento Europeu que Portugal tem a sua liberdade amordaçada. Se assim fosse, não saberíamos aquilo que sabemos. Só pode produzir tal obscenidade quem nunca foi censurado e não sabe o que é liberdade de expressão. O Portugal democrático não merecia isto.
Professor Universitário
in "CORREIO DA MANHÃ" 14/02/10