23/06/2010

EDUARDO DÂMASO







Levantado do chão



José Saramago nunca foi homem de consensos e desde muito cedo escolheu um caminho de combate. Combateu por um tipo de sociedade em que acreditava e combateu contra a sua própria circunstância, de uma pobreza que à partida o destinaria a uma existência nos antípodas daquela que teve.

Nesse sentido, aliás, toda a sua vida tal qual a conhecemos foi a de um homem literalmente levantado do chão. Combateu a fome e lutou pelo conhecimento do mesmo modo que se barricou contra o fascismo e a censura. Combateu a mesquinhez de um certo tipo de exercício do poder como aquele que atacou o seu ‘Evangelho’. Nunca se calou, nem mesmo perante o PCP, com quem foi gerindo uma relação emocional mas cada vez mais discreta e distanciada.
Nesta hora, há quem prefira destacar a obra para não ter de falar de alguns aspectos da biografia. Outros, puxarão pela biografia para subalternizar a obra. Há mesmo quem não destaque nem uma coisa nem outra porque não gostava de Saramago ou lhe era indiferente. Não se discute nenhuma das opções, todas terão as suas razões. Para Portugal, porém, quer se queira quer não, Saramago foi um grande escritor que engrandeceu o País e um homem que nunca abdicou da coragem e da frontalidade. E como ele já não ficam muitos!


in "CORREIO DA MANHÃ"
20/06/10

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