22/04/2010

SÍLVIA DE OLIVEIRA


O que importa se são ignorantes?

É erro, desajustado ou injusto? Que importa classificar o ataque a Portugal? Não vai parar enquanto houver fraquezas para explorar. O que falta é acção do governo
É compreensível a crescente indignação que se sente no país, à medida que se intensificam os presságios de que, depois da Grécia, será a vez de Portugal sucumbir ao estado de falência. É uma palavra pesada. Quem é que empresta dinheiro a uma economia incapaz de honrar os seus compromissos? Dispensam-se, por isso, os presságios que têm sido atirados com tanta insistência, tanto mais que se sabe que só contribuem para piorar a situação e alimentar o vampirismo dos mercados.

Mas quando o nome de Portugal é pronunciado com tanta frequência e por economistas de referência, como o coerente Joseph Stiglitz, dá que pensar. O que o governo nos diz sobre as contas portuguesas, défice e dívida já é suficientemente preocupante. Estado, empresas e particulares estão tão endividados que vivem no fio da navalha. Até os custos do acordar de um vulcão na Islândia vão pesar, e de que maneira. Mas e os números apresentados por Sócrates e Teixeira dos Santos serão reais? A dúvida instala-se e não é simples dar cabo dela, sobretudo quando o passado recente descredibiliza. Antes das eleições, o défice orçamental era inferior a 6% e passados poucos meses já é de 9,4%. Será?

É fácil criticar os que falam de Portugal como a próxima vítima e acusá-los de profetas da desgraça. É fácil desdenhar do presidente checo e apontar-lhe o desplante ou a falta de educação na provocação que fez a Cavaco Silva em Praga, faz sentido duvidar das contas fantasiosas de alguns articulistas estrangeiros e questionar os seus verdadeiros interesses, é normal culpar os grandes investidores, que todos os dias procuram nas fragilidades das empresas, mas neste momento sobretudo dos Estados soberanos, a melhor forma de ganhar dinheiro, é admissível desvalorizar a relevância dos CDS (credit default swaps), que estão longe de ser um indicador credível de aferição do risco de dívida, e faz parte atirar com teorias mais ou menos conspirativas à volta de um tentativa de atentado norte-americano ao projecto do euro. Tudo, mas mesmo tudo, é legítimo para quem está de mãos e pés atados e ainda por cima se sente injustiçado.

Mas e este tipo de reacção terá alguma utilidade? Porque é só isso que importa saber. Mais do que gastar energia a chamar ignorante aos que têm opinião sobre o estado da economia portuguesa e decidem publicá-la, o que verdadeiramente deve preocupar o governo é apresentar factos, mostrar acção, depois de, claro está, assumir com clareza e verdade as debilidades da economia. Não há mal nenhum em assumir fraquezas que estão à vista de todos, mau é não mostrar determinação na solução para o problema e, pior, um perfeito desastre, não fazer nada ou ser demasiado lento na tomada de decisões. Os mercados enganam-se muitas vezes, não querem saber se são justos ou não, nos mercados aposta-se e ataca-se. E não é a Irlanda, é Portugal um dos alvo escolhidos por quem está habituado a explorar as frinchas. Por algum motivo será: o governo irlandês ainda não parou.

Está tudo nas mãos de Sócrates, que sabe bem o que tem a fazer. Já não vai lá com agências de comunicação e roadshows, nem com planos de intenções. O Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC), por exemplo, ainda não passou disso mesmo.

IN JORNAL "i"
20/04/10

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