23/03/2010

RUI HORTELÃO

RUI HORTELÃO

PSD e PS sem rolha para o seu ridículo

A intenção de Pedro Santana Lopes até podia ser boa. Mas em política como na vida em geral, as intenções, boas ou más, contam pouco. Prevalecem os factos, as decisões. Começando pelo autor da proposta da ‘lei da rolha’, qualquer personalidade de relevo na vida do PSD nos últimos 35 anos já, em algum momento, violou as regras que agora se impõem. Alberto João Jardim e Marcelo Rebelo de Sousa, por exemplo, há muito teriam sido afastados. Provavelmente até Francisco Pinto Balsemão teria já tido igual destino. Para não falar dos líderes distritais que, em qualquer partido moderno, têm inerente à função a luta pelos melhores lugares para a sua região, o que torna inevitáveis críticas e pressões públicas sempre que são formadas listas.

Mais surpreendente e insólito do que a proposta – todos nós vivemos sob o risco de ter uma ideia genial ou uma ideia tola – , foi a sua aprovação. Não só porque qualquer pessoa de bom senso percebe que, nos dias de hoje, esta é uma lei impossível de alguma vez vir a ser aplicada com eficácia, ela é disparatada também por acontecer numa instituição com a histórica pluralidade do PSD. Mas, acima de tudo, por ser aplicada em plena cruzada do partido contra o pluralismo e a liberdade de expressão.

Era difícil prestar pior serviço à batalha que a família social-democrata tem travado com o primeiro-ministro, José Sócrates. Ou seja, prestar pior serviço ao País, já que a deliberação do congresso do PSD legitima a dúvida: Como pode um partido fazer da liberdade de expressão a sua maior bandeira e depois limitá-la, em sede estatutária, a tal ponto que impeça todo e qualquer militante de criticar quem manda?

Os portugueses não são estúpidos! Têm-no demonstrado, em sondagens, eleições, na escolha de uma carreira internacional ou na descoberta de negócios capazes de gerar fortunas apesar da falta de consenso e arrojo político. E era bom que o PSD percebesse isto.

O PS tem de fazer o mesmo. Porque, perante uma decisão caricata do adversário, se apressou a explorá-la de forma igualmente ridícula e exagerada no Parlamento. Resultado: os socialistas quiseram pôr legendas num filme falado em português e acabaram a justificar o seu passado.
O mais irónico e ilustrativo do comportamento dos dois partidos de poder em toda esta situação é o facto de ambos (à semelhança dos restantes partidos, acrescente-se) terem já em vigor normas estatutárias que prevêem acções disciplinares como aquelas que o PSD decidiu aplicar e o PS critica.

Os casos de polícia são assuntos de todos nós

Facto: Um polícia matou a tiro um fugitivo. Dúvidas: Havia razões para disparar? A vítima cometera outros crimes além da desobediência à autoridade? Dificilmente saberemos com a exactidão que a perda de uma vida humana exige. Neste, como em todos os casos deste género, a família e amigos da vítima defende-a como podem e o povo divide-se entre a absolvição e a condenação dos envolvidos. Nada de anormal. O que se estranha é que uma instituição como a PSP faça a sua defesa, marginalizando um dos seus. Não está em causa a investigação do procedimento do agente Moreira, nem a sua implacável punição que tem de ser aplicada se for provado que matou sem razões para tal. Estranha-se é a posição da PSP no comunicado que emitiu sobre a morte de MC Snake. Fez questão, por exemplo, de referir as patilhas de segurança da arma e a existência de lagartas para deter automóveis em fuga, mas foi omissa sobre o stress e perigo da perseguição ou sobre a ausência do graduado que liderava a equipa no local. Além das informações que, a coberto do “off-record”, foram sendo dadas aos jornalistas nos dias seguintes. Todas num só sentido: proteger a corporação, remetendo toda a responsabilidade para o agente de 28 anos. Pelo ‘trailer’, percebe-se qual será o caminho que Inspecção-Geral da Administração Interna seguirá ou, pelo menos, aquele que muitos gostavam que esta seguisse. Veremos.

Causa perplexidade quando uma polícia é tão frouxa a proteger um elemento sobre o qual falta ainda provar a culpa; que foi formado na instituição; que disparou sobre alguém com cadastro e que esteve em fuga durante 8km; e que depois de travado, voltou a acelerar para fugir. Sobretudo quando noutras situações – por exemplo, de alegados abusos de poder, uso indevido de viaturas da instituição, tensões hierárquicas ou corrupção – a PSP mostrou uma determinação bem diferente.

Porque, mesmo sendo provada a irresponsabilidade do agente Moreira, a falta de solidariedade é evidente e, mais do que a quaisquer outros, tocará a consciência dos que todos os dias, em nome da PSP, arriscam a vida para preservar a segurança dos portugueses. E isto não é assunto de polícia, é assunto de todos nós.

in"DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
20/03/10

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