30/12/2009

CONSTANÇA CUNHA E SÁ



22 Dezembro 2009 - 09h00

Causas e Consequências

Queixumes

Em vez de governar, Sócrates queixa-se, o que lhe exige um comprovado vazio de ideias e uma boa dose de arrogância.

Como se tem visto, nos últimos dois meses, o Governo minoritário do eng. Sócrates deixou pura e simplesmente de governar – uma tarefa, convenhamos, demasiado árdua que exige uma linha de rumo, uma definição de prioridades e umas tantas iniciativas de fundo que dêem corpo a estes nobres propósitos. Em vez disso, e com a notável excepção dos casamentos entre pessoas do mesmo sexo, o Governo tem compensado a sua notória inutilidade com um rol infindável de queixas sobre tudo o que o rodeia. Quando seria de esperar que o Governo se debruçasse sobre o desemprego ou sobre a catástrofe da economia doméstica, eis que este surge, qual vítima imaculada, envolto num permanente queixume sobre as mais diversas instituições do regime. Ou seja, em vez de governar, o que lhe exigiria coragem, o eng. Sócrates queixa-se, o que lhe exige um comprovado vazio de ideias e uma boa dose de arrogância.

Assim, às segundas-feiras, o primeiro--ministro e os seus principais acólitos queixam-se da oposição, uma oposição "irresponsável", perita em "coligações negativas" e noutro tipo de malfeitorias. Às quartas, a queixa sobe até à Assembleia da República propriamente dita, um órgão que se quer substituir ao Governo através de ‘orçamentos sombras’ elaborados nas costas do povo da qual ela, curiosamente, emana. Por último, em qualquer outro dia da semana, o PS queixa-se, com uma veemência crescente, do Presidente da República, ora porque ele não intervém a mando do dr. António Vitorino, ora porque ele se pronuncia, a despropósito, sobre alguns problemas do país, como o desemprego, exorbitando manifestamente as suas limitadas competências, ora ainda porque a sua própria existência é um entrave às justas aspirações do chefe e do seu pequeno grupo de indefectíveis.

De tudo isto, poder-se-ia concluir, como parece concluir o PS, que as instituições democráticas, em Portugal, existem na exacta medida em que servem interesses obscuros que prejudicam o desenvolvimento do país, obstruindo de forma sistemática a acção gloriosa de um Governo que, curiosamente, se tem distinguido por não conseguir actuar.

Uma conclusão perigosa? Com certeza. Uma tese contraditória? Bastante. Uma estratégia com vista à antecipação das legislativas? Provável. Mas o que sobressai, acima de tudo, é o desnorte e a desorientação de quem só sabe governar sem qualquer tipo de escrutínio.


Constança Cunha e Sá, Jornalista

in "CORREIO DA MANHÃ"

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