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Cansados de blogs bem comportados feitos por gente simples, amante da natureza e blá,blá,blá, decidimos parir este blog do non sense.Excluíremos sempre a grosseria e a calúnia, o calão a preceito, o picante serão ingredientes da criatividade. O resto... é um regalo
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Localizado entre as ruas Jaceguai, Abolição, Japurá e Santo Amaro, o terreno vive um imbróglio há mais de 40 anos.
Desde 1980, o local é centro de uma disputa, envolvendo o diretor do Teatro Oficina, Zé Celso, e o Grupo Silvio Santos, que pretendia construir ali três torres de até cem metros de altura.
O projeto previa mil apartamentos, com mil vagas de garagem, e andares de subsolo que poderiam atingir não só o rio que corre abaixo do terreno, como também o lençol freático que está a quatro metros do solo.
Na sentença, a juíza alega que as torres poderiam causar “danos ambientais e danos ao patrimônio histórico, cultural e arquitetônico, diante da existência de áreas tombadas como o bairro do Bixiga, o Castelinho da Brigadeiro, o Teatro Oficina, o Teatro Brasileiro de Comédia, a Casa da Dona Yayá, Escola de Primeiras Letras e Arcos da Rua Jandaia”.
O Departamento do Patrimônio Histórico concluiu ainda que o projeto desconsidera a paisagem do bairro.
Anteriormente, o projeto do Grupo Silvio Santos até chegou a ser aprovado pelos três órgãos de patrimônio, Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico), Conpresp (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo) e Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional). Mas, diante da disputa, nunca foi concretizado.
Além do Teatro Oficina, o Grupo Silvio Santos encontrou impasses com outras instituições da região do Bexiga e vereadores da cidade que defendem a instalação do parque, como Gilberto Natalini (PV-SP) e também Eduardo Suplicy (PT-SP).
Segundo a arquiteta Marília Gallmeister, coautora do projeto de parque defendido por Zé Celso, a construção dos prédios faria o Teatro Oficina ter luz natural por apenas duas horas por dia.
Tanto o Grupo Silvio Santos quanto a Prefeitura apelaram à decisão do Tribunal. Agora, o caso será encaminhado para avaliação em Segunda Instância.
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Uma espécie de saudade
Agora, os periquitos também me visitam, de quando em vez, na varanda dos meus pássaros, aqui a Sul, onde o sol estala à hora da sombra mais curta.
De há uns anos para cá, por entre as folhas das árvores que costumavam fazer de postes de balizas no nosso campo relvado da Cidade de Luanda, nos Olivais-Sul, começaram, mal a Primavera ameaça desbrotar, a desprender-se periquitos verdes que se espalham pelos céus do bairro com alacridade e vão à procura de outras árvores, em outros bairros. A princípio poucos, como perdidos; depois em bando, como se já estivessem em casa. Nunca os vi no tempo de esfolarmos canelas a ensaiar carrinhos e pontapés de bicicleta, numa cultura de futebol à inglesa que nenhuns outros, da Vila de Catió e do Maracangalha ao Vale do Silêncio tinham. O nosso jogo era direto, sem retorcidos. Se fôssemos oito, não jogávamos quatro para quatro (que estucha!): um ia à baliza, outro (geralmente o Luís Cantante) tirava centros, e os que sobravam dividiam-se nos que cabeceavam ou rematavam (sempre de primeira) e nos que, impondo os cotovelos, procuravam impedir os movimentos atacantes. Uma questão de filosofia. “British Association”.
Nesse tempo só os pardais, e talvez os melros, se libertavam das árvores que cresciam tanto que chegavam às janelas do 8.º andar do Lote 484. Depois reduziram-nas a anãs. Periquitos assim, em bandos desordenados, guinchando de alegria, só os encontrei, pela primeira vez, ao longo das avenidas longas de Khayaban-e-Iqbal e Sunset Boulevard, em Karachi, no Paquistão, automóveis velhos e amolgados, camionetas com enfeites indescritíveis, suprassumo da arte kitsh sobre rodas, táxis-scooters no seu concerto infernal de buzinadelas contínuas, os muezzins cantando monocordicamente as cinco orações do dia. Agora, os periquitos também me visitam, de quando em vez, na varanda dos meus pássaros, aqui a Sul, onde o sol estala à hora da sombra mais curta. Nunca pousam. Seguem o seu caminho. Mas deixam no seu rastro verde-esmeralda aquela espécie de saudade do que não chegou a acontecer.
* Jornalista, escritor
IN "iN" - 02/03/22.