.
NO PRINCÍPIO ERA A RODA...
Cansados de blogs bem comportados feitos por gente simples, amante da natureza e blá,blá,blá, decidimos parir este blog do non sense.Excluíremos sempre a grosseria e a calúnia, o calão a preceito, o picante serão ingredientes da criatividade. O resto... é um regalo
.
Não há outra forma de o qualificar: a partilha de dados pessoais de ativistas russos ao Kremlin por parte dos serviços da Câmara de Lisboa foi uma delação de Estado. Involuntária, muito provavelmente. Irresponsável, garantidamente.
Mas acima de tudo demonstrativa do enorme grau de inadequação da máquina da Administração Pública, que continua toldada por procedimentos cegos e expedientes burocráticos que se assinam de cruz. Disponibilizar nome, telefone e morada de manifestantes e opositores de Vladimir Putin aos serviços diplomáticos russos, no quadro de um regime legal que devia blindar os dados pessoais de todos os cidadãos, é, ainda assim, demasiado grave para nos podermos escudar no amadorismo dos serviços ou num "erro técnico" atribuível a ninguém. Sobretudo porque foi uma prática reiterada durante anos noutras geografias de protesto. Porque aqueles três ativistas, e os outros cujos dados não sabemos a quem foram enviados, têm família, amigos, conhecidos. Têm, fundamentalmente, a legítima esperança de um dia poderem voltar em segurança à terra natal.
Agora, acusar Fernando Medina de conluio com o regime de Vladimir Putin não passa de um exercício trôpego. Nem mesmo aqueles que amplificam estas atoardas pré-eleitorais acreditam honestamente nelas. Isso não invalida, porém, que nos deixemos seduzir pela contra-argumentação em marcha: a de que basta alterar rotinas, promover uma auditoria e cambiar a lei das manifestações para que tudo se arrume numa gaveta. Neste caso não pode haver lugar a esponjas purificadoras. Investigue-se a fundo, mas não se transforme uma trapalhada que manchou o nome de Portugal e do Estado português no Mundo num mero ato negligente de um subalterno.
Um responsável político é-o nos bons e nos maus momentos. O que temos visto até agora, em matéria de probidade pública e ética republicana, é muito pouco para nos sossegar. Mas acaba por ser o retrato fiel de um país que, ao não respeitar os outros, não se respeita a si próprio.
* Director-adjunto
IN "JORNAL DE NOTÍCIAS" - 12/06/21
.