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Cansados de blogs bem comportados feitos por gente simples, amante da natureza e blá,blá,blá, decidimos parir este blog do non sense.Excluíremos sempre a grosseria e a calúnia, o calão a preceito, o picante serão ingredientes da criatividade. O resto... é um regalo
02/09/2016
ANA BACALHAU
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O coração da Maria
Entre a criação e a
destruição, as duas forças que nos movem a todos lutam por ocupar o
maior espaço na nossa vida. Qual delas ganha, cabe-nos a nós decidir.
Pela facilidade com que hoje apontamos o
dedo ao nosso vizinho do lado, acusando-o de todos os nossos males,
parece que o ódio está a ganhar a corrida. Eu contribuo para perpetuar o
ódio que aponto ao apontá-lo com ódio.
Sobretudo, é muito difícil não ceder ao
medo de me deixar contaminar pelos discursos de ódio e de perder a
capacidade de gostar da diferença.
Diferença precisa-se, para que o mundo
que eu crio não esteja cheio de eus. Quero o meu mundo cheio de
indivíduos muito diferentes de mim, que me ensinem coisas e me façam
crescer, crescer, crescer, até que não caiba no mundo que criei e tenha
de criar um novo, maior, melhor, porque o anterior se tornou pequeno,
restrito, como um colete de forças.
Quero criar um mundo que não me aperte
como um colete de forças. Que não espartilhe a vontade de ninguém, que
seja feito à medida das necessidades de cada um dos que nele vivem. Um
mundo que ame mais do que odeie. Que não odeie de todo, se fosse
possível. Mas que, pelo menos, ame mais do que odeie.
Tal como silenciar o amor, silenciar o ódio também não me parece solução.
Fugir de um problema alimenta-lhe o ego,
fá-lo crescer até atingir dimensões desmedidas. Muitas vezes, é quando
finalmente falamos acerca dele que acabamos por colocá-lo no devido
lugar. Deixou de se apoderar de nós e passamos a apoderar-nos dele,
rotulando- o, colando-lhe as palavras certas, delimitando-o, contendo-o.
Falemos do ódio, para lhe perdermos o
medo. Enfrentemo-lo, delimitemo-lo, colemo-lhes as palavras certas. Acho
que só assim poderemos encerrá-lo como assunto no nosso coração e
voltarmos a nossa atenção para a única força criadora do mundo: o amor.
Um coração que consegue manter a sua cor viva, mesmo num fundo negro: o
da fotografia foi feito por uma menina chamada Maria. Deu-mo, dizendo
que tinha começado a estudar música por causa de mim. E eu entrego-lhe
este texto, como gesto de gratidão e de esperança. Se puder dar algum
contributo ao mundo, que seja o de inspirar Marias a entregar os seus
corações a a quem as ouve.
IN "NOTÍCIAS MAGAZINE"
21/08/16
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