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Mon ami' Tsipras
Os socialistas gregos são uma espécie de parentes pelintras da província que o nosso PS quer esconder
Em duas penadas, António Costa "matou" o Pasok - partido socialista
grego, seu camarada na Internacional Socialista e companheiro de bancada
no Parlamento Europeu - e reivindicou para o PS uma afinidade de
circunstância que permite cavalgar a onda da "mudança". Com efeito, para
Costa, a vitória do Syriza "é mais um sinal da mudança da orientação
política que está em curso na Europa". Portanto, os vencedores das
eleições gregas - que se coligaram, não aos esquerdistas do Tu Potami,
que são rivais, não aos socialistas do Pasok, que cheiram mal dos pés,
não aos comunistas do KKE, que são ameaçadores, mas à direita
nacionalista dos Gregos Independentes, numa eloquente demonstração de
como os extremos se tocam - são os improváveis parceiros de mudança dos
socialistas portugueses.
E, no entanto, o Pasok tem mais afinidades
com o PS do que António Costa quer assumir. Neste momento, os
socialistas gregos são uma espécie de parentes pelintras da província
que o nosso PS quer esconder. Mas lá, como cá, os socialistas estão
identificados, justa ou injustamente, com o espectro da bancarrota e do
pedido de ajuda externa. Foram os deles, como os nossos, que tiveram de
chamar a troika. Lá, pelo menos por agora, desenhou-se uma alternativa à
esquerda. Os radicais gregos cumprem, assim, o sonho histórico do nosso
Bloco de Esquerda, substituindo o PS. Mas as comparações acabam aqui.
Porque nem o PS é o Pasok (apesar do caso Sócrates, não se identifica
com a corrupção larvar que medrou no tempo da família Papandreou...) nem
o BE tem a estaleca ou, sobretudo, a liderança do Syriza. Ou, mais
importante, a coragem de dar o salto da esfera do protesto para o arco
da governação.
Ainda assim, a viragem grega pode influenciar outras eleições,
noutros países, e sobretudo as de outubro, em Portugal. O desempenho de
Aléxis Tsipras, os resultados que consiga ou os desastres que provoque
serão determinantes para a decisão de outros eleitorados. Mais uma vez, e
depois de ter sido laboratório da troika, o povo grego será
experimentado numa forma de Governo completamente "fora da caixa". O
protesto chegou ao Poder, veremos como se comporta por lá.
Percebe-se António Costa: ao "apropriar-se" da "mudança"
protagonizada pelo Syriza, impede uma eventual ressurreição do Bloco de
Esquerda e cola o PS a outros movimentos emergentes de esquerda,
retirando-lhes capacidade de crescimento eleitoral. Mas o líder do PS
dificilmente irá mais longe. Por exemplo: advoga ou não, como o Syriza,
uma renegociação da dívida? ?O próprio sucesso ou insucesso de Aléxis
Tsipras há de condicionar o discurso político em Portugal. Ou ele
consegue melhores condições para o reajustamento grego, e, com isso, dá
mais expressão aos argumentos da oposição em Portugal, ou espalha-se ao
comprido, sendo o seu exemplo usado como uma vacina, no argumentário da
coligação PSD/CDS.
De uma certa forma, Passos Coelho é o único que fica sempre a
ganhar com a vitória dos radicais, na Grécia. Se eles se afundarem, dirá
que qualquer política alternativa à do seu governo é "aventureirismo
irresponsável" - e muitos eleitores hesitantes acreditarão. Se os gregos
obtiverem um alívio da austeridade, Portugal apanhará a boleia e o
Governo reivindicará os louros. Irónico, não? A frase recuperada por
estes dias terá vindo para ficar: "Portugal não é a Grécia." Não?
Estamos para ver.
IN "VISÃO"
02/02/15
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